domingo, 15 de agosto de 2010

“CURTA” PORTUGUESA VENCE LUCARNO


RUI PEDRO TENDINHA, em Locarno – DIÁRIO DE NOTÍCIAS

Filme de Gabriel Abrantes, co-realizado pelo norte-americano Daniel Schmidt, venceu o Leopardo de Ouro

Depois de João Salavisa ter vencido a Palma de Ouro, em Cannes, com a "curta" Arena, mais um feito para o cinema português chega agora de Locarno, na Suíça. A History of Mutual Respect, de Gabriel Abrantes, co-realizado pelo norte-americano Daniel Schmidt, venceu ontem o Leopardo de Ouro na secção Leopardos de Amanhã, onde competem as curtas-metragens. Trata-se do segundo Leopardo de Ouro para Portugal, que em 1987 vencia com a "longa"

O Bobo, de José Álvaro Morais. Após a vitória no IndieLisboa, Gabriel Abrantes volta a afirmar--se como cineasta, ele que também é visto como um dos mais promissores artistas plásticos europeus. Tudo isto num ano em que um dos maiores festivais de cinema do mundo faz uma operação plástica irreversível.

Em Locarno, com a chegada de Olivier Père, antigo director da Quinzena dos Realizadores em Cannes, tudo mudou. O novo director artístico programou um outro festival. Um festival com ordem para surpreender e, porque não, chocar.

Nesta 63.ª edição, houve propositadamente menos filmes e um cunho mais cinéfilo. Uma programação sem Hollywood e com atalhos de um radicalismo experimental que seguramente coloca este evento suíço no topo das manifestações da sétima arte.

Dir-se-ia que o espírito da Quinzaine foi óbvio. E, ao contrário das últimas edições, quase que nunca se viram concessões nas sessões da Piazza Grande, onde se costuma exibir cinema de chamado "grande público". Mesmo aí houve o dedo de Père, um director artístico que não teve medo de arriscar, a começar com o filme de abertura, Au Fond des Bois, de Benoit Jacquot, uma aventura erótica filmada em grande plano numa França selvagem de 1865.

Mas a grande sensação na Piazza Grande foi Monsters, de Gareth Edwards, ensaio de cinema de ficção científica, um filme destinado a grandes cultos que repensa o imaginário Guerra dos Mundos, criando-lhe um realismo social em regime do-it-yourself.

Todavia, o perfume do escândalo esteve ancorado em propostas de um extremismo sexual fora do habitual em Locarno, nomeadamente com a inclusão do novo filme de Christophe Honoré na competição. Homme au Bain é uma história de amor gay em que todas as cenas de sexo são explícitas e onde o corpo de François Sagat, vedeta do cinema porno, se transforma em corpo de cinema. O mesmo Sagat que é a estrela de LA Zombie, história de zombies extraterrestres com a assinatura de Bruce LaBruce. Este foi outro filme que gerou bastante controvérsia e que caucionou cenas de sexo sem censura.

Isild Le Besco, a actriz de Au Fond des Bois, apresentou também em competição outra obra de transgressão, o violentíssimo Bas-Fond, o seu terceiro filme. Desta vez, violência sexual no feminino. A crítica suíça achou que era demais. Curiosamente, o palmarés do júri preferiu premiar um outro tipo de cinema.

O Leopardo de Ouro foi para Han Jia, de Li Hongqi, crónica de um certo mal-estar da nova geração chinesa. O filme já está censurado na China. Han Jia tornou-se um verdadeiro papa-prémios. Além do Leopardo de Ouro, recebeu ainda o prémio da crítica (FIPRESCI) e a menção do júri ecuménico.

Um novo valor do cinema mundial

Com 25 anos apenas, Gabriel Abrantes é desde ontem a nova coqueluche do cinema português. O Leopardo de Ouro dos Pardi di Domini é um prémio que consagra novos valores do cinema mundial. Gabriel Abrantes começa a estar habituado a prémios, ele que já venceu em 2009 o Prémio EDP Jovens Artistas. O meio das artes plásticas também o reclama. Com A History of Mutual Respect, realizado a meias com Daniel Schmidt, o seu cinema de humor feroz e de experimentalismo sem igual ganha uma dimensão mais física.

A 11 de Setembro, poderá ser visto no Centro Cultural de Vila Flor, em Guimarães. O dinheiro do prémio de Locarno, dez mil francos suíços (cerca de 7400 euros), garante que vai ser usado na sua nova "curta", com rodagem já a partir desta semana.

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