segunda-feira, 15 de novembro de 2010

BRINDE ASSASSINO

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ANTÓNIO TOZZI, Miami - DIRETO DA REDAÇÃO

Com a recessão que toma conta dos Estados Unidos, os comerciantes vêm apelando para promoções criativas para atrair os consumidores. Assim, algumas lojas de móveis incluem uma TV colorida de tela plana de 50 polegadas no conjunto de sofá oferecido aos clientes. Certas lojas de pneus anunciam que você compra três pneus e ganha o quarto grátis. Como sabemos, as promoções nem sempe são exatamente bons negócios para os clientes, mas servem como chamariz para atrai-los e concretizar algumas vendas.

Nada, porém, supera a ousadia da Nations Trucks, revendedor Ford da região central da Flórida, perto de Orlando. Os proprietários querem incrementar as vendas dos trucks, caminhonetes bastante apreciadas pelo americano médio que vive no interior do país. Geralmente, o perfil deste americano é o de um sujeito branco, politica e religiosamente conservador e apegado aos valores dos ancestrais.

Por isto, não surpreende que este público forme o grande contingente de membros e simpatizantes da NRA (National Rifle Association), a entidade que defende o porte de arma para cada cidadão americano, conforme consta da Constituição dos Estados Unidos.

Pois bem, pensando em atrair esta clientela, os donos da Nations Trucks estão oferecendo de brinde uma arma para cada comprador de uma caminhonete nova. E não é qualquer arma, não. É uma AK 47, submetralhadora de assalto russa!

Como era de se esperar, a "promoção" está provocando muita polêmica no país todo. Nick Ginetta, gerente de vendas da revenda Ford, justificou a promoção como "uma homenagem aos veteranos americanos que defenderam nossa liberdade nas guerras", em alusão ao Veteran’s Day celebrado na última quinta-feira. Entretanto, alguns veteranos que moram na região não pouparam críticas a este tipo de brinde concedido aos compradores de veículos por incentivar o armamento da população.

Além do mais, a revenda não está infringindo nenhuma lei federal ou estadual. Para Ginetta, "estamos apenas dando a chance de cidadãos respeitáveis exercitarem sua liberdade da Segunda Emenda (da Constituição dos EUA) de serem donos de uma arma". E ninguém precisa comprar um carro para adquirir uma arma, desde que preencha os requisitos legais estipulados pelas autoridades estaduais e federal. E nem mesmo a revendedora de carros está tornando-se uma loja de armas e munições.

Tudo isto é verdade, mas que tipo de mensagem está sendo transmitida para os cidadãos? Este tipo de "promoção" serviu para reativar a eterna discussão entre os conservadores e os liberais sobre maior controle de armas em poder da população. Os democratas, quando no poder, sempre tentam limitar a comercialização de armas e munições, enquanto os republicanos brandem o direito constitucional para todo cidadão possuir uma arma para defender sua família e sua propriedade.

Parece racional que o certo seria limitar bastante a posse de armas para evitar mais mortes. Os defensores das armas de fogo argumentam que assassinos matam de qualquer maneira, seja com facas, porretes ou mesmo com as próprias mãos. É fato, mas não dá para negar também que um maluco segurando uma metralhadora pode multiplicar o número de mortes em comparação com uma arma branca ou um pedaço de pau.

Além disto, ninguém pode esquecer que a Constituição dos Estados Unidos da América foi escrita em 1786, quando o país não dispunha da estrutura atual das Forças Armadas e das diversas divisões policiais que hoje atuam no país.

Está mais do que na hora de os republicanos colocarem os pés no século XX!.

* Foi repórter do Jornal da Tarde e do Estado de São Paulo. Vive nos Estados Unidos desde 1996, onde foi editor da CBS Telenotícias Brasil, do canal de esportes PSN, da revista Latin Trade e do jornal AcheiUSA.
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