terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

O “MÓDULO” GEORGIANO DA “REVOLUÇÃO ROSA”

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MARTINHO JÚNIOR

Logo após a sua renúncia, Eduard Chevardnadze confirmou em Moscovo os papeis de determinada linha de conduta Americana e de George Soros nas mudanças em curso na Geórgia.

Corroborando as suas declarações, um analista como Mark MacKinnon confirmava-a a 26 de Novembro de 2003, em “breaking news”, no “Globe and Mail”, sob o título “A revolta da Geórgia carrega a marca de Soros”:

“Foi em Fevereiro que o bilionário financeiro George Soros começou o trabalho para o afastamento do Presidente Georgiano Eduard Chevardnadze.

Nesse mês, fundos do seu Instituto Open Society, enviaram uma activista de Tbilissi, de 31 anos, chamada Giga Bokeria, para a Sérvia, a fim de se encontrar com membros do movimento Otpor (Resistência) e aprender como eles usaram as demonstrações de rua a fim de derrubar o ditador Slobodan Milosevic.

No Verão, a fundação de Soros pagou as viagens para a Geórgia de activistas do Otpor, a fim de realizarem cursos de três dias, ensinando a mais de 1000 estudantes sobre como se podia fazer uma revolução pacífica.

Na última semana, o Instituto Liberty que Bokeria havia ajudado a fundar, foi instrumental em organizar os protestos de rua que eventualmente conduziram Chevardnadze a assinar os seus papéis de renúncia.

Bokeria disse que tinha sido em Belgrado que ele tinha aprendido o valor de manter elevada a moral, assim como fazer uso de pressão sobre a opinião públic , tácticas que se comprovaram muito persuasivas nas ruas de Tbilissi no mês a seguir às eleições parlamentares.

Em Tbilissi a ligação ao Otpor foi observada como uma das várias acções em que Soros se empenhou em apoio ao movimento anti Chevardnadze: ele também fundou uma estação de Televisão da oposição popular que foi crucial na mobilização em apoio da revolução de veludo e deu apoio financeiro a um grupo juvenil que liderou os protestos de rua.

Ele também encetou um sólido relacionamento com o Chefe da oposição a Chevardnadze, Milhail Saakashvili, um advogado de educação Nova Yorkina que espera vencer as eleições próximas, a 4 de Janeiro.

Há um ano Soros presenteou Saakashvili com a Condecoração da sua fundação, a Open Society Award.

É também um dado assente da opinião pública aqui que Soros foi a pessoa que planificou a queda de Chvardnadze, disse Zaza Gachechiladze, Editor em Chefe do Mensageiro da Geórgia , um jornal em língua Inglesa da Capital” .

“Em meados de 2002 Chevardnadze fez uma de suas várias intervenções acerca das interferências políticas de Soros no País e, no seguimento delas, alguns jovens invadiram os escritórios do Instituto Liberty, de Bokeria, vandalizando os computadores e batendo em vários membros do staff.

Soros terá sugerido durante uma conferência de imprensa em Moscovo que o Governo de Chevardnadze não estava em condições de garantir eleições parlamentares em 2003.

É necessário mobilizar a sociedade civil de forma a que as eleições sejam livres e justas por que muitas forças estão determinadas a falsificar, ou a manipular, não deixando que elas sejam livres e justas, disse Soros.

Isso aconteceu na Eslováquia no tempo de Vladimir Meciar, na Croácia , no tempo de Franjo Tudjman e na Jugoslávia no tempo de Milosevic.

O dinheiro e as aparentemente boas intenções de Soros foram inicialmente bem recebidas nos antigos Estados Soviéticos quando a Open Society se instalou na sequência do derrube da Cortina de Ferro, mas algumas dessas relações foram cortadas.

A Ucrânia e a Bielo Rússia expulsaram a Open Society acusando a Organização de interferência política e os seus escritórios em Moscovo foram recentemente invadidos por homens mascarados e armados por causa duma aparente disputa de propriedade”.

Se o decano diplomata James Baker assumia o papel de um dos estrategas mais influentes do “dossier” Cáucaso – Mar Cáspio (com incidência na Geórgia), George Soros, segundo os observadores mais atentos ao desenvolvimento do processo político na Geórgia, instrumentalizava em tempo oportuno o “volte face” em benefício dos interesses em relação ao petróleo do Mar Cáspio, por parte dos Americanos e seus aliados Ocidentais.

A 4 de Dezembro de 2003 a “BBC” publicava um artigo de Natália Antelava, com o título “como fazer uma revolução” e subtítulo “Slobodan Djinovic observou a revolução das rosas de sua casa na Sérvia”:

“É quase como o desafio de derrubar Milosevic outra vez. Estou realmente muito feliz, lembrou ele.

Em 2001 Djinovic foi um dos líderes do movimento estudantil da Sérvia , Otpor que contribuiu para derrubar Slobodan Milosevic.

Alguns meses antes da oposição ter voltado do avesso o parlamento em Tbilissi pedindo a resignação do Presidente Eduard Chevardnadze, Djinovic esteve na cidade explicando a sua experiência revolução não sangrenta aos estudantes Georgianos.

Estamos a trabalhar com movimentos civis em vários Países e não quero nomeá-los, mas a Geórgia é o primeiro sucesso, disse Djinovic.

Os Georgianos primeiro formaram laços com a Otpor no verão de 2003, quando vários activistas da sociedade civil visitaram Belgrado numa viagem patrocinada pela fundação de Soros (criada pelo bilionário financeiro George Soros).

Alguns dias depois do seu regresso Tbilissi criou a sua própria versão do Otpor.

Muitos grafites por escrito sob o rótulo de Kmara ! (basta é basta!) foram aparecendo por toda a Capital.

Precisamos de encontrar uma mensagem que qualquer um possa entender e basta é basta! é precisamente o que precisávamos, disse Tea Tutberidz, que esteve no grupo inicial de cerca de 20 estudantes activistas e é agora um dos líderes dum forte movimento com 3000 aderentes.

O Otpor é uma fonte de inspiração. O nosso objectivo é tornar as coisas atractivas, pouco usuais e dizer ao povo que é ele que está a fazer a mudança no País, disse Tutberidze.

Então eles limparam as ruas, organizaram concertos, colectaram dinheiro para caridade, protestaram contra a violência da polícia e socorreram-se da TV para condenar o Governo.

Durante a acção, a mensagem era sempre a mesma: o Governo falhou no cumprimento de suas promessas e era tempo para as pessoas acertarem as contas”.

Martinho Júnior

Publicado no ACTUAL nº 376 a 20 de Dezembro de 2003.

Nota:

Esta narrativa que foi dada à estampa em Dezembro de 2003 ilustrava as implicações das sucessivas “revoluções coloridas” nos Balcãs e na Geórgia, assim como os relacionamentos que foram cultivados então.

A substituição simples duma elite por outra sem pôr em causa a lógica capitalista, foi uma fórmula de fortalecimento do império na Europa do Leste e no Cáucaso, a fim de continuar “expandindo” noutras direcções.

O “alastramento” dessas “revoluções coloridas” contribuiu para o deslocamento da “Organização do Tratado do Atlântico Norte” para leste, até às paragens e cenários de hoje: Iraque, AfPaq e Índico Norte, semeando estratégias de tensão.

O que está a acontecer no norte de África, revoltas populares “espontâneas” de carácter emocional, sem programas pré definidos e amadurecidos, alimentados por processos financeiros resultantes da desenfreada especulação espalhada por George Soros por todo o mundo, sem a implicação de organizações sociais com tarimba de luta em benefício das camadas populares mais exploradas, só pode desembocar na “reconstrução” da envenenada “democracia representativa” para, conforme esclarecia o grande poeta Pablo Neruda, se mudarem apenas as moscas.

No Egipto, o papel das suas forças armadas geradas pelos interesses anglo saxónicos ao longo de várias décadas, está a ser outro factor, talvez o factor decisivo, que está a contribuir sincronizadamente para levar a revolução à morte antes mesmo do seu possível parto.

Uma revolta quanto baste a fim de que a revolução seja apenas um aborto.

Cinquenta anos depois do início da luta armada em Angola, é dever daqueles que são fiéis por inteiro, com convicções firmes e princípios de sabedoria, ao movimento de libertação em África, baterem-se pelos ideais de libertação de seus povos, dando continuidade ao esforço que vem do passado, impedindo que se perca a energia e a experiência histórica que vem do passado, a energia e a história com sentido de vida, temperada com amor, dignidade e respeito por todos os oprimidos da Terra.

É necessário cultivar-se hoje a paz que promove a justiça social, o equilíbrio humano, cultivar-se profundamente a paz social, sem o fosso de desigualdades que os homens do “mercado” estão a provocar deliberadamente em nossas nações frágeis e perante nossos sacrificados povos.

É necessário e urgente saúde para todos, combatendo a “saúde mercenária” que tanta gente está a matar em todo o país!

É necessária a educação, acabando-se antes de mais nada com o analfabetismo num esforço nacional amplo, integrador e abrangente!

É necessária a prática desportiva para educação e formação da nossa juventude a partir da escola e em programas sincronizados entre a Educação e a Juventude e Desportos!

É necessário urbanismo, habitação, sanidade pública, água potável para todos num país que em África é uma das poderosas mães de água!

É necessário não entregar nossas potencialidades e nossas riquezas aos abutres, não só aqueles que vêm de fora, mas aqueles que estão a abdicar de responsabilidade patriótica e se rendem aos grandes falcões enquanto “expandem” a irresponsabilidade consumista que eles impulsionam (veja-se o caso da refinaria do Lobito)!

Há 8 anos não se atendeu um primeiro alerta, talvez um equeno grito num deserto, mas hoje com quase uma década de ausência de tiros é possível corrigir muita coisa que afinal foi tão mal feita e está tão mal parada.

Se o homem e o respeito pela natureza forem colocados de forma sensível, responsável, com organização, cidadania e participação, no devido lugar, dar-se-á continuidade à gesta que advém do passado e não haverá espaço para as manipulações contraditórias de que os seguidores de George Soros, pseudo-revolucionários gerados do pântano do capitalismo financeiro mais abjecto, têm sido pródigos.

Angola e as elites que cultivam dignidade histórica, estão a tempo de se reencontrar e reencontrar a sua vanguarda cuja chama se iluminou sempre em benefício de todo o povo e não dum grupo elitista sem outra estratégia senão o lucro que em África desemboca no neo colonialismo típico das eras post independência.

A sobrevivência da identidade angolana tem tudo a ver com tudo isto e sua afirmação é perante um dos maiores riscos contemporâneos, uma globalização que é crise permanente e um beco sem saída!
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