domingo, 19 de dezembro de 2010

SOLUÇÃO PARA O CONFLITO NA BÉLGICA PODERÁ SER DIVISÃO DO PAÍS

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DEUTCHE WELLE – 19 dezembro 2010

Seis meses após a eleição de um novo Parlamento, a Bélgica continua sem governo e as divergências entre flamengos e valões permanecem. Caso pode vir a ser solucionado com a divisão do país.

Um abismo profundo continua dividindo a Bélgica em duas partes: os flamengos, no norte do país, e os valões, no sul. Independente dos Países Baixos desde o ano de 1830, a Bélgica é desde então uma monarquia. Essa divisão foi impulsionada pelas classes alta e média de católicos, que falam francês e vivem no sul do país, numa região conhecida como Valônia.

O francês foi instituído como idioma administrativo oficial nas Forças Armadas, no Parlamento e como língua nas escolas do país. O holandês permaneceu como idioma considerado como aquele dos servos e agricultores, continuando a ser falando principalmente na região de Flandres, mais populosa, mas também mais pobre. Nos primeiros anos de escola, a língua ainda era permitida, mas nos últimos anos escolares elas transcorriam apenas em francês.

Os pequeno-burgueses do norte flamengo começaram a resistir contra a repressão de seu idioma. Aos poucos, foi se formando o "Movimento Flamengo". O ano de 1873 foi considerado um marco no que diz respeito à oficialização do holandês como língua oficial também no contato com departamentos públicos, tribunais e nos últimos anos escolares.

Em contrapartida, os valões que viviam na região de Flandres também fundaram, no fim do século 19, um movimento de defesa do francês contra o bilinguismo naquela região. Mais tarde isso viria a ocorrer também no sul do pais, na região conhecida como Valônia, pois os valões começaram a temer o os cidadãos de língua holandesa – mais numerosos que eles – de Flandres.

Bruxelas: dois idiomas são permitidos

A divergência idiomática é até hoje um assunto no país. Apenas a capital Bruxelas continua sendo uma exceção neste contexto, sem pertencer em termos de língua nem à região dos flamengos nem à dos valões, embora geograficamente esteja localizada em Flandres. Bruxelas e seus arredores são bilíngues, formando uma terceira região belga, além da Valônia e de Flandres.

Estas duas, porém, continuam brigando. Há três anos, os prefeitos de língua francesa em três distritos de Bruxelas, que pertencem a Flandres, não são reconhecidos pelo governo regional. Alguns flamengos temem por seus direitos: "Este solo é flamengo e foi conquistado à custa de luta. Os francófonos não têm nada a ver com isso e na verdade nem deveriam estar aqui", afirma um belga flamengo.

Norte rico, sul mais pobre

No entanto, mesmo que o conflito entre flamengos e valões venha à tona acima de tudo no que diz respeito à língua, por trás do problema escondem-se especialmente interesses econômicos. Nos anos 1960, a economia do norte flamengo foi fortalecida, com um boom da indústria química, e a pobreza foi rapidamente eliminada. O sul valão, com sua indústria siderúrgica, foi empobrecendo.

Hoje, os aproximadamente seis milhões de flamengos, relativamente pobres se comparados aos cerca de quatro milhões de valões do sul, acabam transferindo recursos para auxiliar seus compatriotas francófonos. Diante disso, os flamengos desejam, há anos, obter uma maior autonomia financeira para sua região – proposta rejeitada com veemência pelos habitantes da Valônia, região de alto índice de desemprego, na qual as pessoas temem não conseguirem mais arcar com os custos sociais.

Seis meses após as eleições antecipadas, a Bélgica encontra-se ainda sem um governo. Os membros da Nova Aliança Flamenga, que festejaram a vitória nas urnas com todas as pompas, fracassaram na tentativa de formar uma coalizão de governo da mesma forma que os socialistas valões. Segundo foi noticiado na mídia, um grêmio reuniu-se em Paris, em dezembro, a fim de encontrar uma solução para o país de dez milhões de habitantes.

A proposta é a seguinte: os flamengos, mais estáveis economicamente, permaneceriam como um Estado novo e soberano. O presidente francês, Nicolas Sarkozy, segundo consta, já estaria festejando a inclusão da Valônia francófona, inclusive de Bruxelas, a seu país. E a pequena comunidade que fala alemão, situada nas redondezas de Aachen, poderia ser anexada a Luxemburgo, uma possibilidade que vem sendo sondada há semanas.

"A Bélgica não tem mais futuro"

Para muitos, a culpa deste dilema é do nacionalista flamengo Bart de Wever, cujo partido NVA saiu vitorioso das urnas nos Flandres, região mais populosa do país, em junho último. À pergunta do semanário alemão Der Spiegel sobre quanto tempo a Bélgica ainda continuará existindo, Bart de Wever afirmou que o país "não tem mais futuro". Segundo ele, a Bélgica é "pequena demais para ter grandes ambições políticas".

De Wever joga a culpa pelo fracasso das negociações nos socialistas francófonos, que, segundo ele, se opõem a qualquer reforma. "Os valões, sobretudo os socialistas francófonos, são o partido mais forte e bloqueiam qualquer reforma. Por isso, digo: a Bélgica não funciona mais, o país fracassou", julga o presidete do NVA.

"Ainda no omelete europeu"

Mas o que pode acontecer, se a Bélgica realmente deixar de existir? "Se o país for descentralizado ou até mesmo se dividir algum dia, ainda assim continuamos na União Europeia. Se o ovo belga se quebrar, continuamos a ser um omelete europeu", explica despreocupado o historiador belga Dirk Rochtus, da Universidade de Antuérpia, à Deutsche Welle.

Há quem veja a situação com maior temor. A Comissão Europeia categoriza o país como falido. Nos bastidores da Comissão, acredita-se que a Bélgica irá ser obrigada a apelar para o fundo de apoio em tempos de crise da UE antes mesmo da Espanha, no início de 2011. O mais irônico é que o premiê Yves Leterme, que já não é primeiro-ministro belga, ainda ocupa até o fim do ano o cargo de presidente do Conselho da UE, assumindo a responsabilidade de combater a crise do euro. Mesmo que em casa ele tenha seus próprios e difíceis problemas.

Autor: Arne Lichtenberg (sv)
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