sábado, 19 de fevereiro de 2011

A GANÂNCIA TAMBÉM SE ABATE

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MANUEL ENES FERREIRA – EXPRESSO – 19 fevereiro 2011

Próximo indicador risco-país: peso económico dos familiares em torno do poder político.

As últimas semanas têm sido agitadas nas bandas da África do Norte e do Médio Oriente. O receio de que possa ter um efeito mimético em muitos outros países da região ou fora dela são fundados. E entre outras razões porque os festins desbragados têm sempre de chegar ao fim.

Infelizmente, na maioria dos casos, mais tarde do que cedo. É simplesmente surpreendente o modo como em diversos países a(s) família(s) que exerce(m) o poder transformam o seu próprio país na sua quinta e colocam a população ao seu serviço! Na Tunísia, o Presidente deposto Zine Ben Ali estava no cargo há 24 anos.

Ao longo destes anos, e após o casamento em 1992 com a sua segunda mulher Leila Trabelsi, começou a construir um imenso império de interesses económicos. As duas famílias controlavam entre 30 e 40% da economia do país, com ativos calculados em 10 mil milhões de dólares. Tudo quanto era negócio, pequeno ou grande, deveria ter uma quota entregue a um membro da família. Nada escapou, de bancos a transportes, passando pelo turismo, o imobiliário, a indústria ou os media.

Mais ou menos ao lado, Hosni Mubarak está no poder há 30 anos. Relatórios internacionais dão conta de uma fortuna entre 40 e 70 mil milhões de dólares (o que o coloca à frente de Carlos Slim do México e de Bill Gates), sendo que os seus dois filhos, Gamal e Alaa, serão detentores de 15 a 30 mil milhões! Como conseguiram? Obrigando, por exemplo, as empresas estrangeiras a cederem 20% do seu capital para operarem no país. O filho Gamal, que estava à frente da comissão política do Partido Nacional Democrata, era apontado como o seu sucessor.

Infelizmente a África Subsariana tem também os seus exemplos. Apenas para referir alguns, no Gabão, Omar Bongo, depois de ter sido Presidente durante 42 anos, morre em 2009 e é substituído, em eleições contestadas, pelo seu filho Ali Bongo, o qual já era convenientemente ministro da Defesa depois de ter sido ministro dos Negócios Estrangeiros.

A fortuna que lhe é atribuída, proveniente dos negócios do petróleo no país, bem como de outras atividades económicas, é bem conhecida. No Congo-Democrático morreu o Presidente Joseph Kabila, sucedeu-lhe o filho (democraticamente...) Laurent-Désiré Kabila. Na Guiné-Equatorial, esse novo emblema da CPLP, Teodoro Obiang Nguema, o atual Presidente, deu um golpe de Estado em 1979 e fuzilou o tio-deposto. Na altura era o chefe da segurança nacional. Está lá há já 31 anos.

A apropriação indevida de receitas do petróleo e do gás natural confere-lhe uma fortuna calculada em mais de 2 mil milhões de dólares em bancos fora do país. Perante isto, o próximo passo a dar pelas agências de notação de risco será criar um Indicador Risco-País onde seja ponderado um fator até aqui ausente: a importância dos interesses económicos e negócios que os filhos e enteados do inner circle do poder político, seja chefe de Estado seja primeiro-ministro, têm na economia do país. Talvez isso ajudasse e prevenisse...

Manuel Ennes Ferreira , professor do ISEG

Texto publicado no caderno de economia do Expresso de 12 de fevereiro de 2011
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2 comentários:

Anónimo disse...

E Angola? O Ennes Ferreira anda com amnésia? O que é roubado pelo dirador angolano Dos Santos e família e sua côrte ele não faz referência... Porque será dótor?

Anónimo disse...

O "professor" Ennes sabe tanto de África que, em relação à RDC, troca o filho pelo pai...