1,2 milhões de euros. É este o valor que o governo português adjudicou à PSP para a preparação da Cimeira, com a compra de blindados e carros de transporte. Durante dias, os olhos da PSP vão estar postos no Parque das Nações. Christian Hartmann/reuters
GONÇALO VENÂNCIO – i ONLINE – 06 novembro 2010
É uma das leis não escritas em Washington: "Quando o presidente viaja, a Casa Branca viaja com ele." Olhando para os números, ninguém dúvida. A delegação norte-americana que Barack Obama chefiará na Cimeira da NATO em Lisboa será composta por uma pequena multidão - algures entre as 800 e as mil pessoas.
.
Há os agentes dos serviços secretos (denunciados pelos fatos escuros, auriculares e óculos Ray Ban), a miríade de conselheiros (políticos, de imprensa, de defesa) e até equipas médicas e gastronómicas. E, se for seguida a tradição, é bem provável que a "Besta" - a limusina de 300 mil dólares com visão nocturna e blindagem reforçada - seja vista a circular nas ruas de Lisboa. A América é a grande super potência mundial e onde quer que o presidente vá, isso vê-se. Agora, some-se a Obama mais duas dezenas de chefes de Estado europeus, o secretário-geral das Nações Unidas, o presidente da Rússia, o secretário geral da NATO, o presidente do Banco Mundial e percebe-se a dimensão de um evento que vai transformar Lisboa no palco político mundial no fim de semana de 19 e 20 de Novembro.
Alheios a um frenesim para o qual os lisboetas se vão mentalizando, os decisores políticos do espaço euro-atlântico preparam-se para tomar decisões críticas para o futuro da NATO. Nas palavras do próprio secretário-geral, Anders Fogh Rasmussen, a cimeira de Lisboa é "uma das mais importantes da história" da Aliança Atlântica.
E porquê? Aos 61 anos, a senhora nascida para "manter os Americanos dentro [da Europa], os soviéticos fora e os alemães em baixo" perdeu o inimigo comunista mas continua mais activa que nunca - como, por exemplo, a dura guerra no Afeganistão prova.
Todavia, isso não esconde os sintomas de várias doenças - curáveis - que tardam em ser debeladas. Com o passar dos anos e com o alargamento a 28, a NATO ganhou peso sem fazer as necessárias reformas institucionais. Com o alargamento, multiplicaram-se as divergências quanto aos interesses e percepção das ameaças (note na página seguinte, por exemplo o que pensam os portugueses sobre os principais temas de segurança). E o diálogo entre a União Europeia e a NATO em matéria de segurança é praticamente inexistente - algo pouco compreensível quando 21 dos 28 aliados são também estados-membros da União Europeia. Mas a mais preocupante de todas as doenças está ligada à própria vitalidade da relação transatlântica.
Nos últimos anos, europeus e americanos têm divergido de forma clara em temas como o uso do poder militar, investimento em segurança e mesmo percepção das ameaças. Num mundo em que os europeus são, por regra, mais consumidores do que produtores de segurança e em que os seus orçamentos de Defesa têm levado cortes drásticos, poderão os Estados Unidos procurar novas parcerias que melhor satisfaçam as suas necessidades? "Não acredito que isso seja provável apesar de ter havido, desde sempre, um debate nos Estados Unidos sobre o ''burden sharing'' [partilha dos encargos]" explicou em entrevista ao i no passado mês de Outubro, Robert Bell. Mas o representante do secretário da Defesa para a Europa acrescenta: "Devemos incentivar os nossos parceiros europeus a contribuírem mais para o esforço colectivo, seja através de formadores no Afeganistão ou através do reforço das capacidades da NATO. Ao mesmo tempo, devemos reconhecer que os nossos parceiros europeus têm um papel fundamental num esforço colectivo do qual, em última análise, os EUA beneficiam."
Não se sabe durante quanto tempo este racional será dominante na classe política americana. Em especial, numa fase em que os principais problemas de segurança deixaram de estar no Velho continente e os europeus mostram cada vez menos vontade em actuar fora dele.
Num tempo de constrangimentos financeiros para todos, e num ambiente estratégico dramaticamente diferente daquele que norteou o conceito de 1999, o sucesso da NATO dependerá muito da forma como europeus e americanos forem capazes de ultrapassar esta divergência de fundo.
Sucesso que dependerá também da forma como a Aliança solidificar as suas parcerias. Neste particular, a Cimeira de Lisboa, à qual se junta o presidente russo, assume particular importância. "Nos últimos 11 anos os Estados Unidos perceberam que uma das maiores - senão a maior - prioridade de segurança nacional é a cooperação. É impossível resolvermos tudo sozinhos e a NATO está bem ciente de que tem de trabalhar com os seus parceiros para resolver os problemas" assinala Bell. O novo Conceito Estratégico, um documento que orientará a NATO na próxima década, reflectirá um ambiente estratégico em que o terrorismo, as alterações climáticas, o ciberterrorismo e as lições do Afeganistão ganharam importância - e cuja natureza interdependente forçará a NATO a olhar para fora.
Na Europa comunitária há já vários documentos que levaram o selo da capital portuguesa, como a Agenda de Lisboa ou o Tratado de Lisboa. Este mês, nascerá o Conceito de Lisboa - esperam os Aliados, com o realismo e o consenso que faltaram aos anteriores.
.
Alheios a um frenesim para o qual os lisboetas se vão mentalizando, os decisores políticos do espaço euro-atlântico preparam-se para tomar decisões críticas para o futuro da NATO. Nas palavras do próprio secretário-geral, Anders Fogh Rasmussen, a cimeira de Lisboa é "uma das mais importantes da história" da Aliança Atlântica.
E porquê? Aos 61 anos, a senhora nascida para "manter os Americanos dentro [da Europa], os soviéticos fora e os alemães em baixo" perdeu o inimigo comunista mas continua mais activa que nunca - como, por exemplo, a dura guerra no Afeganistão prova.
Todavia, isso não esconde os sintomas de várias doenças - curáveis - que tardam em ser debeladas. Com o passar dos anos e com o alargamento a 28, a NATO ganhou peso sem fazer as necessárias reformas institucionais. Com o alargamento, multiplicaram-se as divergências quanto aos interesses e percepção das ameaças (note na página seguinte, por exemplo o que pensam os portugueses sobre os principais temas de segurança). E o diálogo entre a União Europeia e a NATO em matéria de segurança é praticamente inexistente - algo pouco compreensível quando 21 dos 28 aliados são também estados-membros da União Europeia. Mas a mais preocupante de todas as doenças está ligada à própria vitalidade da relação transatlântica.
Nos últimos anos, europeus e americanos têm divergido de forma clara em temas como o uso do poder militar, investimento em segurança e mesmo percepção das ameaças. Num mundo em que os europeus são, por regra, mais consumidores do que produtores de segurança e em que os seus orçamentos de Defesa têm levado cortes drásticos, poderão os Estados Unidos procurar novas parcerias que melhor satisfaçam as suas necessidades? "Não acredito que isso seja provável apesar de ter havido, desde sempre, um debate nos Estados Unidos sobre o ''burden sharing'' [partilha dos encargos]" explicou em entrevista ao i no passado mês de Outubro, Robert Bell. Mas o representante do secretário da Defesa para a Europa acrescenta: "Devemos incentivar os nossos parceiros europeus a contribuírem mais para o esforço colectivo, seja através de formadores no Afeganistão ou através do reforço das capacidades da NATO. Ao mesmo tempo, devemos reconhecer que os nossos parceiros europeus têm um papel fundamental num esforço colectivo do qual, em última análise, os EUA beneficiam."
Não se sabe durante quanto tempo este racional será dominante na classe política americana. Em especial, numa fase em que os principais problemas de segurança deixaram de estar no Velho continente e os europeus mostram cada vez menos vontade em actuar fora dele.
Num tempo de constrangimentos financeiros para todos, e num ambiente estratégico dramaticamente diferente daquele que norteou o conceito de 1999, o sucesso da NATO dependerá muito da forma como europeus e americanos forem capazes de ultrapassar esta divergência de fundo.
Sucesso que dependerá também da forma como a Aliança solidificar as suas parcerias. Neste particular, a Cimeira de Lisboa, à qual se junta o presidente russo, assume particular importância. "Nos últimos 11 anos os Estados Unidos perceberam que uma das maiores - senão a maior - prioridade de segurança nacional é a cooperação. É impossível resolvermos tudo sozinhos e a NATO está bem ciente de que tem de trabalhar com os seus parceiros para resolver os problemas" assinala Bell. O novo Conceito Estratégico, um documento que orientará a NATO na próxima década, reflectirá um ambiente estratégico em que o terrorismo, as alterações climáticas, o ciberterrorismo e as lições do Afeganistão ganharam importância - e cuja natureza interdependente forçará a NATO a olhar para fora.
Na Europa comunitária há já vários documentos que levaram o selo da capital portuguesa, como a Agenda de Lisboa ou o Tratado de Lisboa. Este mês, nascerá o Conceito de Lisboa - esperam os Aliados, com o realismo e o consenso que faltaram aos anteriores.
.
Sem comentários:
Enviar um comentário