… na colónia angolana de Cabinda
ORLANDO CASTRO*, jornalista – ALTO HAMA
A organização Human Rights Watch (HRW) denuncia a existência de prisões arbitrárias, tortura e outras violações graves dos direitos humanos por parte das Forças Armadas angolanas em Cabinda, no seu relatório anual apresentado hoje em Bruxelas.
A HRW dá conta da «prisão arbitrária» de mais de 40 independentistas desde 2007, a maioria dos quais alegam ter sido sujeitos a tortura e maus-tratos durante longos períodos de detenção, com o objetivo de extrair confissões.
Se calhar o reeleito presidente da República de Portugal (país que assinou acordos de protectorado com Cabinda), Cavaco Silva, ainda não teve tempo para ler, mesmo que na diagonal, o relatório da Human Rights Watch.
Durante a campanha eleitoral, Cavaco Silva parecia ter acordado e, com isso, voltado a ter memória. Será que isso fará Portugal alterar a sua posição em relação a Cabinda? Claro que não. Nem José Eduardo dos Santos permitiria tal leviandade ou traição.
Seja como for, e por muito que queiram os novos protagonistas (entre eles Cavaco Silva), a História de Portugal (bem como o próprio país) não começa em 1974. E no que às ex-colónias de África respeita, começou antes dos Acordos do Alvor. Antes com honra, depois com uma aviltante subserviência perante os novos donos desses países.
No caso de Cabinda, Portugal honrou desde 1885 e até 1974, o compromisso que incluiu constitucionalmente Cabinda na Nação portuguesa de forma autónoma. Depois disso, rendido à cobardia nacional, varreu a honra e a dignidade para debaixo do tapete, seguindo as instruções dos novos e ignorantes donos do país.
Assim, no artigo da Constituição Portuguesa referente à Nação Portuguesa sempre constava que o território de Portugal era, na África Ocidental, constituído pelo Arquipélago de Cabo Verde, Arquipélago de S. Tomé e Príncipe, Forte de S. João Baptista de Ajuda, Guiné, Cabinda e Angola.
Ao contrário do que têm dito os donos da verdade portuguesa, quase todos paridos a partir de 1974 nas latrinas da ignorância e da ignominia, estava bem expresso (mesmo para os que para contarem até 12 têm de se descalçar) que Cabinda e Angola eram situações diferentes.
Pouco antes de 1974, a Lei Orgânica do Ultramar (1972) dizia de forma clara que os territórios ultramarinos se compunham das províncias com a extensão e limites que constarem da lei e dos tratados ou convenções internacionais aplicáveis.
Várias gerações de estudantes portugueses anteriores a 1974, certamente não será o caso do secretário de Estado de Cooperação, João Gomes Cravinho, mas é com certeza o de Aníbal Cavaco Silva, leram que existia uma completa separação jurídica e administrativa que a Constituição indicava para o território de Cabinda.
Se o reeleito presidente da República de Portugal não renegar o passado, como fez enquanto foi primeiro-ministro e durante o primeiro mandato em Belém, poderá, incluive, consultar os livros escolares dessa altura.
Creio que ao nível dos principais políticos portugueses ainda haverá no activo quem se recorde que, a nível alfandegário – por exemplo, Cabinda e Angola funcionavam também como territórios distintos.
Também haverá quem tenha tesmunhado, in loco, que no aniversário da assinatura do Tratado de Simulambuco havia cerimónias específicas.
Em 1955, apenas para facilitar a administração do Enclave e alguma economia de meios, Cabinda foi considerada como um distrito de Angola. Apenas por isso já que em termos constitucionais tudo continuava na mesma.
Segundo o general Silvino Silvério Marques, que foi Governador Geral de Angola, entre 1962 e 1965, o ministro Silva Cunha escreveu que, aquando a preparação do Estatuto Político-administrativo da Província de Angola de 1963, Salazar mandou perguntar ao Governador Geral de Angola se concordava que Cabinda, administrada nessa altura como distrito de Angola, passasse a usufruir de um estatuto especial de autonomia.
Recorde-se que ouvido o Conselho Económico-Social de Angola, foi respondido negativamente depois de ponderadas as razões que lhe eram apresentadas, situação que se manteve durante os 13 anos de luta.
Assim, fazendo fé de que a História de Portugal não começou só a ser escrita a partir de 1974, a situação de Cabinda relativamente a Angola era, em 1974, idêntica à dos protectorados belgas do Ruanda e do Burundi em relação ao Congo Belga.
Isto significa que se tornaram independentes, separados do Congo ex-belga, depois de, em 1960, a grande colónia belga se ter tornado independente.
Na recente campanha eleitoral para as presidenciais em Portugal, Cavaco Silva afirmou que muitos dos que o acusam, "para serem mais honestos do que eu, têm que nascer duas vezes".
No caso de Cabinda, não sei se nascer duas vezes seria suficiente para Cavaco Silva deixar de varrer o lixo do seu país para debaixo do tapete. É que, por muitas que sejam as vezes que nasça, o lixo continua lá.
*Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.
ORLANDO CASTRO*, jornalista – ALTO HAMA
A organização Human Rights Watch (HRW) denuncia a existência de prisões arbitrárias, tortura e outras violações graves dos direitos humanos por parte das Forças Armadas angolanas em Cabinda, no seu relatório anual apresentado hoje em Bruxelas.
A HRW dá conta da «prisão arbitrária» de mais de 40 independentistas desde 2007, a maioria dos quais alegam ter sido sujeitos a tortura e maus-tratos durante longos períodos de detenção, com o objetivo de extrair confissões.
Se calhar o reeleito presidente da República de Portugal (país que assinou acordos de protectorado com Cabinda), Cavaco Silva, ainda não teve tempo para ler, mesmo que na diagonal, o relatório da Human Rights Watch.
Durante a campanha eleitoral, Cavaco Silva parecia ter acordado e, com isso, voltado a ter memória. Será que isso fará Portugal alterar a sua posição em relação a Cabinda? Claro que não. Nem José Eduardo dos Santos permitiria tal leviandade ou traição.
Seja como for, e por muito que queiram os novos protagonistas (entre eles Cavaco Silva), a História de Portugal (bem como o próprio país) não começa em 1974. E no que às ex-colónias de África respeita, começou antes dos Acordos do Alvor. Antes com honra, depois com uma aviltante subserviência perante os novos donos desses países.
No caso de Cabinda, Portugal honrou desde 1885 e até 1974, o compromisso que incluiu constitucionalmente Cabinda na Nação portuguesa de forma autónoma. Depois disso, rendido à cobardia nacional, varreu a honra e a dignidade para debaixo do tapete, seguindo as instruções dos novos e ignorantes donos do país.
Assim, no artigo da Constituição Portuguesa referente à Nação Portuguesa sempre constava que o território de Portugal era, na África Ocidental, constituído pelo Arquipélago de Cabo Verde, Arquipélago de S. Tomé e Príncipe, Forte de S. João Baptista de Ajuda, Guiné, Cabinda e Angola.
Ao contrário do que têm dito os donos da verdade portuguesa, quase todos paridos a partir de 1974 nas latrinas da ignorância e da ignominia, estava bem expresso (mesmo para os que para contarem até 12 têm de se descalçar) que Cabinda e Angola eram situações diferentes.
Pouco antes de 1974, a Lei Orgânica do Ultramar (1972) dizia de forma clara que os territórios ultramarinos se compunham das províncias com a extensão e limites que constarem da lei e dos tratados ou convenções internacionais aplicáveis.
Várias gerações de estudantes portugueses anteriores a 1974, certamente não será o caso do secretário de Estado de Cooperação, João Gomes Cravinho, mas é com certeza o de Aníbal Cavaco Silva, leram que existia uma completa separação jurídica e administrativa que a Constituição indicava para o território de Cabinda.
Se o reeleito presidente da República de Portugal não renegar o passado, como fez enquanto foi primeiro-ministro e durante o primeiro mandato em Belém, poderá, incluive, consultar os livros escolares dessa altura.
Creio que ao nível dos principais políticos portugueses ainda haverá no activo quem se recorde que, a nível alfandegário – por exemplo, Cabinda e Angola funcionavam também como territórios distintos.
Também haverá quem tenha tesmunhado, in loco, que no aniversário da assinatura do Tratado de Simulambuco havia cerimónias específicas.
Em 1955, apenas para facilitar a administração do Enclave e alguma economia de meios, Cabinda foi considerada como um distrito de Angola. Apenas por isso já que em termos constitucionais tudo continuava na mesma.
Segundo o general Silvino Silvério Marques, que foi Governador Geral de Angola, entre 1962 e 1965, o ministro Silva Cunha escreveu que, aquando a preparação do Estatuto Político-administrativo da Província de Angola de 1963, Salazar mandou perguntar ao Governador Geral de Angola se concordava que Cabinda, administrada nessa altura como distrito de Angola, passasse a usufruir de um estatuto especial de autonomia.
Recorde-se que ouvido o Conselho Económico-Social de Angola, foi respondido negativamente depois de ponderadas as razões que lhe eram apresentadas, situação que se manteve durante os 13 anos de luta.
Assim, fazendo fé de que a História de Portugal não começou só a ser escrita a partir de 1974, a situação de Cabinda relativamente a Angola era, em 1974, idêntica à dos protectorados belgas do Ruanda e do Burundi em relação ao Congo Belga.
Isto significa que se tornaram independentes, separados do Congo ex-belga, depois de, em 1960, a grande colónia belga se ter tornado independente.
Na recente campanha eleitoral para as presidenciais em Portugal, Cavaco Silva afirmou que muitos dos que o acusam, "para serem mais honestos do que eu, têm que nascer duas vezes".
No caso de Cabinda, não sei se nascer duas vezes seria suficiente para Cavaco Silva deixar de varrer o lixo do seu país para debaixo do tapete. É que, por muitas que sejam as vezes que nasça, o lixo continua lá.
*Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.
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