quarta-feira, 13 de outubro de 2010

BRASIL - NOS ALVORES DA DEMOCRACIA PARTICIPATIVA

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Marina Silva conquistou quase 20% dos votos válidos no primeiro turno - Agência Brasil/Arquivo

MARTINHO JÚNIOR

A situação da “democracia representativa” em todo o Mundo é desesperante por que em função da crise-corolário da lógica capitalista, nunca os eleitos viraram tanto as costas aos interesses dos seus eleitores como agora.

Essa situação provém da extrema e quase nunca controlada influência do económico e financeiro sobre o político, num processo laboriosamente construído desde que a Reserva Federal dos Estados Unidos foi tomada pelos bancos privados das “grandes famílias”: enquanto os eleitores só exercem o voto, os poderes económicos, quase sempre pela via de poderosos “lobbies”, conduzem aqueles que foram eleitos, durante o tempo intermédio das eleições, a defender seus próprios interesses e conveniências, ainda que contrariando os interesses da base social que os catapultaram pela via do voto. (1)

O modelo Anglo Saxónico está hoje mais que nunca viciado e por todo o Mundo as “democracias representativas” dão sinais de esgotamento nas suas opções e incompatibilidade com os interesses dos Povos que os eleitos, a partir das assembleias de voto, dizem representar.

A Revolução Cubana foi desde logo um caso único: reforçando o que era revolucionário, (a Revolução passou a ser o único “lobby” para o Povo Cubano), tem vindo a conferir, década após década, consistência aos processos participativos, de tal modo que esse é um dos vários “segredos” da resistência nacional, ainda que com todos os traumas de 50 anos de agressões e bloqueio.

Esse sistema que tem sido criticado por gerações de falcões, não garantiu somente, conjuntamente com outros factores, a sobrevivência da Revolução: hoje é um farol e um desafio para que outros, mesmo seguindo figurinos multipartidários, correspondam às necessidades que se vão radicalizando de aprofundamento da democracia ao invés da armadilha em que se caiu. (2)

A segunda revolução tecnológica, aquela que nos conduziu aos satélites, aos computadores, à Internet, dá possibilidade agora aos Estados que advogam o multipartidarismo de começar a introduzir reformas no sentido de que o espaço ocupado pela “representatividade” ceda cada vez mais lugar à “cidadania participativa”.

Por todo o Mundo as ideias da “transferência” da “representatividade” para a “cidadania participativa” tendem a ganhar consistência, pelo menos pela via de algumas vanguardas que põem corajosamente o modelo Anglo Saxónico em cheque.

Por outro lado há outro fenómeno concomitante: o poder de quem controla os meios de comunicação massiva, estando muito mais sincronizado com os interesses e conveniências das oligarquias, tende a chocar com a independência dos interesses das outras classes, de sua expressão pública e das ideias progressistas que ganham novo fôlego.

Quando em Portugal por exemplo, o eleitorado percebe que o Governo corresponde muito mais ao “diktat económico e financeiro” de Bruxelas do que às motivações do Povo Português, fenómeno que expressa a sucessiva traição dos eleitos, as clivagens tornam-se cada vez mais visíveis e a necessidade de se encontrarem novos rumos é evidente.

Os constitucionalistas (os portugueses têm-se mantido neste campo como “excelentíssimos dinossauros”), começam a ter outros motivos que exigem a revisão de suas estafadas filosofias e “praxis”, pois eles poderão ser os primeiros fomentadores do que se torna necessário alterar no sentido de abertura ao fluxo de equilíbrios comunicativos que se começa a exigir entre o exercício do Poder e os interesses do Povo.

Os que controlam os meios de difusão massiva começam a ser postos em causa pela subtil “formatação da mentalidade” que promovem e tentam amarrar milhões às conveniências que parece até terem seu berço na Idade Média.

Por estas razões interessa a Portugal as eleições no Brasil, como interessa a todos os CPLP.

O destino da emergência do Brasil joga-se também com o processo da “transferência” (um processo que não é tão pacífico quanto isso) da via “representativa” para a via da “cidadania participativa”, com a vantagem de ter sido o Brasil a dar início aos Fóruns Sociais Mundiais e à experiência pioneira de Porto Alegre.

As presentes eleições parece terem tido também o condão de recuperar o significado de “cidadania participativa” de Porto Alegre em benefício agora do Rio Grande do Sul e, quando nas próximas eleições for balanceado o processo que ora se vai dar início, os desafios poderão tornar-se ainda mais alargados, não só alargados a outros Estados do Brasil, mas também servir de exemplo e de estímulo a outros fora do Brasil, incluindo no quadro das emergências e dos próprios BRIC.

A entrevista realizada pelo Carta Maior a Tarso Genro, novo Governador do Rio Grande do Sul, traz-nos algumas respostas: (3)

“Já estamos a providenciar para que o Rio Grande do Sul desenvolva um inédito sistema de participação popular e de controle público, integrando as experiências do Conselho de Desenvolvimento Económico e Social, dos Conselhos Regionais de Desenvolvimento, da Consulta Popular, do Orçamento Participativo e da participação virtual. Pretendemos construir um cinturão de controle público do Estado e de indução à produção de políticas públicas pelo Estado, dando grande importância ao Orçamento Participativo que foi praticamente sufocado nos dois últimos governos.Obviamente que o Orçamento Participativo, assim como as outras formas de participação, tem que ter âmbitos de interferência. Não é possível, por exemplo, submeter ao Orçamento Participativo a necessidade ou não de construir uma nova ponte sobre o Guaíba. Mas podemos e devemos submeter ao Orçamento Participativo quais são as prioridades de cada região, quais investimentos o Estado deve fazer, a partir da mobilização da sociedade, da formação de opinião e do reconhecimento do peso que tem a decisão popular presencial. Nós gostaríamos que, ao final dos nossos quatro anos, tivéssemos, a partir do Rio Grande do Sul, um reconhecimento tão grande quanto teve Porto Alegre com o Orçamento Participativo instituído a partir do governo Olívio Dutra.Acho que é possível fazer isso, até porque, hoje, a adição de meios tecnológicos para consulta de opinião, para formação de opinião e para controle público do Estado é um elemento vital para a reorganização da democracia, que sofre uma crise de representação não só aqui no Brasil pela ausência de uma reforma política, mas em todo o mundo porque o Estado não se aparelhou para fazer uma colecta de opiniões de novos grupos sociais, de uma nova juventude, de novos movimentos que se organizam em redes sociais de opinião e que, hoje, pouco interferem nas decisões do Estado.”

(…)

“Queremos já no primeiro ano de governo montar essa nova estrutura de participação popular cidadã, como estamos chamando, para que o Rio Grande do Sul possa, paulatinamente, transitar para ser um exemplo de controle público do Estado e de produção de decisões a partir da participação cidadã.”

O tema do renascimento cultural, que introduzi em “Brasil – Eleições, ou um imenso limiar de renascimento cultural?” não podia também deixar de ter o processo do Rio Grande do Sul como referência no longo caminho para a construção da justiça social alargada e do desenvolvimento sustentado que se poderá conseguir ao longo do século XXI. (4)

O renascimento cultural pressupõe a utilização das “novas ferramentas tecnológicas” disponíveis, a fim de implicar os novos métodos de gestão do Estado nas possibilidades do exercício da “cidadania participativa” de maneira a impedir que aquilo que deve ser emanação da cidadania, seja vilipendiado pelos “lobbies”.

Precisamente por África se encontrar tão longe dum processo dessa natureza, embora esteja apenas “do outro lado do Atlântico”, ele deve ser observado com todo o interesse.

Tem havido pelo menos um caso em que se tem vindo a ventilar a necessidade de participação dos cidadãos nos seus processos político-democráticos internos e esse caso é Angola, todavia (pela sua imensa timidez) muito longe do nível do que vai acontecer a partir de agora no Rio Grande do Sul.

A construção da “democracia cidadã e participativa” no Brasil é um processo que interessa à outra globalização, a Americano – Africano – Latina, por contraposição ao sinal cultural de raiz eminentemente Anglo Saxónico e precisamente por se expandir numa emergência tão estratégica para o Ocidente como a do Brasil, interessa ao diálogo aberto na América Latina (com os componentes da ALBA e Argentina sobretudo), ao diálogo aberto no seio da CPLP (que deve ter como referência muito especial a emergência do Brasil), bem como ao diálogo de todos os países Não Alinhados que compõe o vasto Sul global.

Notas e contribuições:

- (1) – A crise da democracia representativa – José Luiz Quadros de Magalhães –
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4828
- (2) – Eleições cubanas têm participação de opositores – Hideyo Saito –
http://www.josemarti.com.br/portal.php?noticia&mostra&645 ; Prólogo – A Revolução Cubana uma reinterpretação – Rui Mauro Marini – A partir do livro de Vânia Bambirra – Junho de 1974 – http://www.marini-escritos.unam.mx/015_cuba_port.htm ; Girardi, um teólogo italiano reflecte sobre a Revolução Cubana – Resistir info – Miguel Urbano Rodrigues – http://resistir.info/mur/girardi_mur.html ; Brasil-debate: Cuba é uma ditadura? – Breno Altnman – Kaosenlared – http://www.kaosenlared.net/noticia/brasil-debate-cuba-uma-ditadura
- (3) – RS terá um sistema inédito de participação popular e cidadã – Marco Aurélio Weisseimer – Carta Maior – Página Um –
http://pagina--um.blogspot.com/2010/10/rs-tera-sistema-inedito-de-participacao.html
- (4) – Brasil: eleições ou um imenso mar de renascimeto cultural? – Martinho Júnior – Página Um –
http://pagina--um.blogspot.com/2010/10/brasil-eleicoes-ou-um-imenso-limiar-de.html
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1 comentário:

Anónimo disse...

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