quinta-feira, 30 de setembro de 2010

COMPARAÇÕES

.

MIGUEL PORTAS – SOL, opinião

Onde e como é que isto tudo começou? Não me lembro, deve ter sido algures por Agosto, em França. Ou, talvez, uns meses antes, na Alemanha. Ou ainda antes, em Itália.

Para sermos inteiramente francos, até é capaz de ser história antiga, com décadas em cima, para não falar em séculos. Refiro-me, claro está, à questão da expulsão dos ciganos.

Houve uma comissária europeia, por sinal luxemburguesa, que se atirou ao Presidente francês, afirmando em público o que só alguns se atreviam a pensar em privado: que era preciso recuar até à II Guerra Mundial para se encontrar na Europa paralelo no tratamento de um grupo humano.

A senhora Reding não se referia ao holocausto, incomparável, do ponto de vista das consequências, à deportação. Ela referia-se, isso sim, ao substrato que justificou, num caso, o envio para campos de concentração e, noutro, o reenvio lá para a terra deles.

Reza o dito substrato que os ciganos são assim e são assado, como se fossem todos iguais, como se devesse pagar o justo pelo pecador, como se vivessem todos da droga ou todos proibissem as crianças de estudar. Tal como, de resto, os judeus de outras eras, que toda a gente sabia avaros e agiotas, exploradores do povo simples e a quem a iconografia medieval atribuía pés espalmados e narizes aduncos. Foi muito bem feita a comparação.

Oproblema de Sarkozy é que eles, os Romes, são cidadãos europeus. Fossem de outro lugar e era fácil: expediam-se por avião e via postal para a Roménia ou para o grão-ducado do Luxemburgo que, pelos vistos, gosta deles e se habituou a receber outras ra- ças, como a dos portugueses (gente incapaz e incompetente na terra deles, pelo menos é essa a opinião de um tal de Medina Carreira, que adora o FMI).

A segunda dificuldade de Sarkozy foi com uma ordem de serviço do seu Ministério do Interior. Alguém interpretou as instruções orais à letra e lá apareceram elas com a palavra ciganos escarrapachada. Nada disto é matéria de opinião. E porque não, o Parlamento Europeu aprovou uma resolução muito dura para o Presidente francês.

Os socialistas votaram a favor, os do PSD abstiveram-se e os do CDS, colocando as feiras na gaveta, foram contra. Mas... uns dias depois, no Parlamento português, ordens de cima puseram o PS a chumbar, com PSD e CDS, uma resolução similar.

De repente, havia um inquérito a decorrer, talvez Sarkozy blá--blá , e talvez se não deva o Estado português intrometer na vida dos outros, embora Bruxelas se meta com os nossos orçamentos. E, para que a coerência fique completa, passaram-se mais uns dias e, nos Açores, PS e PSD votaram favoravelmente a mesmíssima moção que o BE apresentara em São Bento. Depois digam-me que tudo isto faz imenso sentido e que nos encontramos ante gente da mais insuspeita respeitabilidade...
.

Greve geral na Espanha: PUJANTE AVISO DE DESCONTENTAMENTO SOCIAL

.

PRENSA LATINA – 30 setembro 2010

Madri, 30 set (Prensa Latina) A greve geral contra os planos de ajuste do governo espanhol pôs hoje sobre a mesa uma potente mensagem: o crescente descontentamento social daqueles que estão sendo sancionados por uma crise que não provocaram.

A Espanha estremeceu ontem pela primeira greve nacional que os dois principais sindicatos ibéricos, Comissões Operárias (CO) e a União Geral de Trabalhadores (UGT), realizam contra as políticas econômicas de José Luis Rodríguez Zapatero.

Motivos mais que suficientes para um protesto pelo duro corte da despesa pública, uma reforma trabalhista que facilita e barateia a demissão, redução de salários, congelamento de pensões e um projetado plano para estender a idade de aposentadoria a 67 anos.

Contra a maioria dos prognósticos, a sétima greve geral da democracia espanhola não terminou com a derrota do sindicalismo, pese que quase todos as manchetes da "grande imprensa" a julgam nesta quinta-feira como um fracasso.

Os desqualificativos dos meios de comunicação (de 10 jornais só um reconheceu o impacto da mobilização) não tomaram por assombro os máximos representantes das duas centrais operárias.

Em nada me surpreendem essas classificações, respondeu hoje de maneira contundente o secretário geral de CO, Ignacio Fernández, a uma pergunta da apresentadora do programa "Os Cafés da manhã", da Televisão Espanhola.

Imagino o que dirão amanhã as grandes manchetes dos meios, porém mais cedo ou tarde reconhecerão este clamor popular, antecipou ontem à noite Fernández ao fechamento de uma gigantesca marcha em Madri, como destaque da jornada de reivindicações.

Seu homólogo da UGT respaldou esse ponto de vista quando denunciou que "temos sofrido uma campanha de descrédito obscena".

"Pararam cerca de 10 milhões de pessoas", ratificou Méndez depois de assegurar que independentemente da visão quantitativa, há uma qualitativa, justo a excluída de quase todas as análises jornalísticas, mais inclinados à versão da patronal, que cifrou a participação em pouco confiável cinco por cento.

À margem das guerras de cifras e de quem foi ou não trabalhar, a mobilização dos trabalhadores ficou patente nas multitudinárias manifestações que sacudiram todas as grandes cidades deste país, opinou o jornal Público.

Centenas de milhares de pessoas se reuniram em uma centena de cidades como Madri, Barcelona, Valencia e Andaluzia, segundo cálculos sindicais.

Um importante aviso à administração de Rodríguez Zapatero que, na opinião de Público, terá agora que decidir se o considera justificativa suficiente para dar um passo atrás em uma controvertida reforma trabalhista que precariza o emprego.

O movimento sindical tem posto o dedo na ferida ao denunciar que tanto na Espanha como no resto da Europa, os governos de turno tentam desvirtuar o sucesso dos protestos para esconder o progressivo mal-estar frente aos planos de austeridade.

Medidas que só nesta nação submergem no desemprego mais de quatro milhões e meio de assalariados, o dobro da taxa da União Europeia (UE).

O mal-estar, portanto, tem calado nos últimos meses em muitos estados do bloco comunitário, com levantamentos em Atenas, Roma, Paris, Riga, Varsóvia, Praga, Nicosia e a de ontem em Bruxelas, o mesmíssimo coração das instituições da UE.

O sindicalismo espanhol convidou o governo a tomar nota do alcance da greve geral que paralisou grande parte do país e lhe exigiu uma retificação de sua política econômica de corte neoliberal.Após acusar o governo de Rodríguez Zapatero de converter em culpado as vítimas da crise financeira, criticou que seu partido, o Socialista Operário Espanhol, tenha aceitado de maneira submissa a chantagem dos mercados financeiros.

Mas a mensagem mais categórica das centrais operárias foi que unicamente negociarão com o poder central na condição da retificação de suas políticas antissociais, aprovadas sob pressão dos organismos multilaterais de crédito.

Tão de moda por estes tempos, os programas de austeridade, em lugar de acelerar a recuperação do emprego e da economia, como sustentam seus promotores, castigarão os setores mais desfavorecidos, adverte o movimento sindical europeu.

Ou o que é pior, alargarão a brecha entre ricos e pobres em um continente que se apreciava de seus altos índices de bem-estar e olhava esse fenômeno como algo privativo do chamado Terceiro Mundo.

asg/edu/es
.

ONU - O MUNDO RECLAMA SOLUÇÕES

.

PRENSA LATINA – 30 setembro 2010

Nações Unidas, 30 set (Prensa Latina) - Nações Unidas retoma hoje seu ritmo habitual depois de 10 dias de reuniões ao mais alto nível, discursos presidenciais, discussões sobre candentes temas internacionais e uma infinidade de contatos bilaterais.

A intensa atividade começou no passado 20 de setembro com uma cúpula dedicada a analisar a marcha para os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, a qual concluiu com sérias dúvidas em torno do avanço dessas metas em 2015, a data acordada para serem atingidas.

O debate geral anual da Assembleia da ONU foi aberto no dia 23 pelo chanceler do Brasil, Celso Amorim, que desde o princípio lançou uma forte condenação, em nome da América Latina e do Caribe, contra o bloqueio dos Estados Unidos contra Cuba.

Essa denúncia foi secundada ao longo dos cinco dias de discursos no plenário por chefes de Estado, premiês, chanceleres e ministros de cerca de 30 países.

Entre eles, além do Brasil, estiveram Malawi, a União Africana, Sri Lanka, Zimbábue, Haiti, Namíbia, Lao, Santa Luzia, Dominica, Timor Leste, Suriname, África do Sul, Espanha e Vanuatu.

Também Antigua e Barbuda, Granada, Nicarágua, Equador, Ilhas Salomão, Gambia, Zâmbia, Lesotho, Argélia, San Vicente e as Granadinas, Venezuela, Belice, Uruguai, Paraguai e Rússia.

No próximo dia 26 de outubro, a Assembleia Geral votará, pelo décimo nono ano consecutivo, uma nova resolução de repúdio ao bloqueio norte-americano contra Cuba.

No ano passado, 187 países pronunciaram-se contra a medida norte-americana, na votação mais alta registrada sobre esse assunto desde 1991, com apenas três contra (Estados Unidos, Israel e Palau) e duas abstenções (Ilhas Marshall e Micronésia).

O debate geral sessionou presidido pelo suíço Joseph Deiss e abarcou uma gama de temas que vão desde a crise econômica e financeira mundial e a luta contra o narcotráfico, o terrorismo e o crime organizado até as tragédias naturais no Haiti e no Paquistão.

A necessidade de uma reforma da ONU, em especial do Conselho de Segurança em sua integração, as categorias de membros e o direito ao veto, bem como a chamada revitalização da Assembleia Geral também foram quase uma constante nas intervenções.

A lista de problemas abordados nos discursos inclui também os casos da península coreana e o programa nuclear do Irã, as crises em Gaza, Somália, Sudão, Níger, Congo, Iraque, Guiné, Serra Leoa, Quirguistão e Afeganistão.

A mudança climática também não escapou às análises das delegações, as quais, em boa medida, expressaram pessimismo sobre a eventual obtenção de resultados reais e concretos na cúpula a se celebrar em Cancún em dezembro deste ano.

Do mesmo modo, destacaram as referências ao Oriente Médio, com ênfase no reinício das negociações diretas entre Tel Aviv e a Autoridade Nacional Palestina e a intransigência de Israel para prosseguir a construção de assentamentos de colonos israelenses na Cisjordânia.

Durante debates na Assembleia Geral registraram-se pronunciamentos favoráveis à realização de negociações em torno do programa nuclear do Irã, país alvo de novas sanções decretadas pelo Conselho de Segurança em junho passado.

A disposição à retomada de contatos foi expressada tanto pelo governo iraniano como pelo chamado grupo 5+1, integrado pelos cinco membros permanentes do Conselho (Estados Unidos, Rússia, China, França e Reino Unido), mais a Alemanha.

E como clamor unânime destacou a demanda do mundo subdesenvolvido por uma nova ordem econômica e financeira internacional e para que as nações ricas cumpram com seus compromissos de ajuda oficial ao desenvolvimento.

mv/vc/es
.

CONCLUI PROPAGANDA ELEITORAL PARA ELEIÇÕES BRASILEIRAS

.

PRENSA LATINA – 30 setembro 2010-09-30

Brasília, 30 set (Prensa Latina) - A propaganda eleitoral para as eleições gerais do próximo domingo concluirá hoje com o último debate televisivo dos principais candidatos à presidência do Brasil para o período 2011-2014.

Ao debate assistirão os aspirantes ao Palácio de Planalto pelo Partido dos Trabalhadores (PT, no governo), Dilma Rousseff, pelo opositor Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), José Serra, pelo Partido Verde (PV), Marinha Silva, e pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), Plinio de Arruda Sampaio.

De acordo com a Lei Eleitoral, a propaganda eleitoral termina três dias antes das eleições e só será reiniciada dois dias depois em caso de um segundo turno ou nos estados ou no Distrito Federal onde não se definam seus governadores no primeiro turno.

Os resultados das últimas pesquisas apontam que Dilma tem cerca do 50 por cento da intenção de voto. Detrás aparece o aspirante pelo opositor Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), José Serra, com entre 25 e 28 por cento e Marinha Silva, do Partido Verde (PV), com 13 por cento.

Até a semana anterior todas as empresas pesquisadoras davam a Dilma como virtual vencedora no primeiro turno das eleições, prognóstico mantido nesta semana por dois institutos, enquanto Datafolha prevê agora um possível segundo turno.

Ainda que analistas e especialsitas locais abstêm-se de dar por seguro o sucesso da aspirante petista no próximo domingo, todos coincidem em que sua vantagem é tão ampla que teria que ocorrer algo inusual para que Dilma não se converta dentro de três dias na primeira presidenta eleita do Brasil.

Neste dia vence também o prazo para os votantes solicitar reposição da carteira eleitoral em caso de extravio, por ser indispensável para votar, ato que no Brasil é obrigatório, salvo para jovens de 16 e 17 anos, analfabetos e idosos maiores de 74 anos.

Para as eleições de 2010 o Tribunal Superior Eleitoral determinou que além do título (carteira) de eleitor, o votante tem que apresentar um documento de identidade com foto, caso contrário estará inabilitado para exercer o voto e terá que justificar sua ausência, bem como pagar uma multa por não coincidir às urnas.

No entanto, essa sentença será analisada também neste dia pelo Supremo Tribunal Federal, ante o qual o Partido dos Trabalhadores apresentou recurso para que seja eliminado esse segundo documento.

Cifras oficiais refletem que para as eleições do domingo estão inscritos uns 135 milhões 800 mil brasileiros, que devem eleger o novo presidente do país, os governadores dos 26 estados e do Distrito Federal, a dois terços do Congresso Nacional, e às Assembleias Legislativas estaduais e distrital.

Agrega que nas eleições de 2010 se inscreveram 22 mil 570 candidatos, deles nove para optar pelo Palácio de Planalto (sede do governo), 171 para governadores, 273 para senadores, seis mil 36 para deputados federais e 15 mil 280 para legisladores estaduais e do Distrito Federal.

mv/ale/bj
.

DIREITA x ESQUERDA – ASSUNTO ENCERRADO?

.

RUDOLFO MOTTA LIMA * – DIRETO DA REDAÇÃO

No clima das eleições, escolho como assunto do nosso encontro aqui no DR um tema que acredito venha bem a propósito. Estará realmente extinta, como instrumento de orientação na política, a clássica divisão entre esquerda e direita?

As palavras “direita” e “esquerda” , sabemos, surgiram na ambiência da Revolução Francesa e continuam a fazer parte das crônicas políticas nos dias de hoje, mas há severos críticos que lhes negam validade, argumentando que a complexidade que as sociedades atuais revelam não permite mais essa redução , tida como maniqueísta e, hoje, sem razão de ser. Direita e esquerda não mais existiriam como tais porque estariam superadas as diferenças que justificariam os termos, tendo como marco simbólico dessa superação, entre outros, a queda do Muro de Berlin.

Não sou um especialista em política. Minhas opiniões aqui são a de um ser político, não de um especialista. Vivencio a política como um cidadão atento e é nessa condição que, sem excessivas preocupações teóricas e usando o senso comum e, por que não dizer, o sentimento, coloco-me ao lado dos que não acham que essa distinção esteja sepultada, porque ela talvez seja da própria essência da política, transcendendo o ocasional e tendo a ver com algo que persegue o homem desde os seus inícios.

Creio que a caracterização da “esquerda” e da “direita” reflete a oposição, tão velha quanto o mundo, entre os que se empenham primordialmente pela igualdade entre os homens – porque acreditam que ela tem a ver com um problema social – e os que consideram a desigualdade uma coisa natural, intrínseca à essência da comunidade humana e, portanto, algo pelo qual não adianta lutar.

É evidente que essa dicotomia não pode ser vista segundo radicalismos que excluam posições intermediárias, tendentes a obter um espaço entre esses duas posturas. Isso está demonstrado em diversos momentos em que se busca a carreira solo de uma “terceira via” política e explica, também, diversas alianças, tidas até como surpreendentes, que se fazem à esquerda ou à direita.

Contudo, correndo conscientemente o risco da simplificação do real, penso que será de esquerda aquele que, por ideias e ações, propugna pela redução das desigualdades sociais e defende políticas que pretendam dar mais igualdade aos desiguais, aos desprovidos, como forma de permitir aos seres humanos em geral o bem-estar e a elevação da autoestima. De direita será o que a isso não se propõe, por não acreditar na superação das desigualdades por meio de ações sociais de redistribuição e por considerar mais efetivo (ou confortável para seus interesses) acreditar na liberdade de iniciativa individual.

Em nosso país, ainda que se pretenda escamotear a presença desses segmentos na política, eles existem e dão sequência aos fortes embates em torno do poder que, ao longo dos anos, aqui vêm sendo travados. Creio que, hoje, as correntes de esquerda, no Brasil, são as que defendem uma maior participação do Estado na busca das soluções para a desigualdade, e políticas que levem à inclusão social. As da direita, confiando mais nas forças de mercado para que a correção de eventuais desníveis sociais venha a se fazer, acreditam na redistribuição dos ganhos derivados do esforço individual

Aqui, uma observação: é sempre bom evitar considerações de ordem moral sobre as duas posições. Dizer-se, por exemplo, que a direita é composta por pessoas de caráter duvidoso ou apenas interessadas na exploração do próximo é repetir , no sentido contrário, a postura dos que, no passado, diziam que os comunistas comiam criancinhas... Afirmar-se que a esquerda é reduto da virtude e da perfeição, pura e simplesmente, é esquecer a complexidade da teia dos indivíduos que a compõem, nem sempre executores modelares do bem.

De qualquer forma, a esquerda e a direita permanecerão existindo enquanto perdurarem, no mundo, as desiguldades entre os homens. Apregoar a sua extinção “por não ter razão de ser” é condenar a Humanidade à convivência passiva, omissa, indiferente, com iniquidades e perversidades sociais. E, me desculpem, isso acaba sendo uma posição da direita...

*Advogado formado pela UFRJ-RJ (antiga Universidade de Brasil) e professor de Língua Portuguesa do Rio de Janeiro, formado pela UERJ , com atividade em diversas instituições do Rio de Janeiro. Com militância política nos anos da ditadura, particularmente no movimento estudantil. Funcionário aposentado do Banco do Brasil.
.

QUAL A ORIGEM DESSE ÓDIO?

.

MARCELO DA SILVA DUARTE, São Paulo – CORREIO DO BRASIL – 30 setembro 2010

Um editorial que poderia ter entrado para a história recente da democracia brasileira como exemplo de amadurecimento da liberdade de expressão, respeito ao processo eleitoral e à cidadania, acabou revelando todo o ódio de classe que a elite paulista nutre pelo projeto político petista para o Brasil.

Todo partido político tem direito a um projeto de governo. O PSDB de José Serra e Fernando Henrique Cardoso planejava, em 20 anos, fazer com que o Brasil esquecesse a era Vargas. Escolheu, para viabilizá-lo, a despeito do substantivo composto “social-democracia” em sua sigla, mero embuste semântico, o pensamento neoliberal.

O conceito de modernização com o qual o PSDB trabalhava nos anos FHC passava, necessariamente, pelas teses enunciadas pelo Consenso de Washington. O projeto tucano de desenvolvimento traduziu tal aparente consenso pela (i) estabilização macroeconômica via superávit fiscal, à custa do sucateamento dos serviços públicos, pela (ii) tentativa de realização das ditas reformas estruturais, traduzidas pelas (a) privatizações – que entregaram à iniciativa privada, diga-se de passagem, a preço de banana, a Vale do Rio Doce, destino do qual se safou, por pouco, a hoje primeira maior empresa petrolífera do mundo em lucro sobre faturamento, a Petrobras –, pela (b) redução do papel e da atividade normativa do Estado na economia – dinossauro ao qual recorreram, na recente bancarrota mundial, nove entre 10 economistas antes neoliberais – e desregulamentação do mercado financeiro, a fim de atrair, pela terceira maior taxa de juros da economia mundial, o que também freava o consumo e mantinha a inflação sob controle, o capital especulativo internacional – grande responsável pela referida bancarrota –, e, por fim, pela (iii) retomada do investimento via iniciativa privada, donde a concentração de renda e de capital na mão de setores empresariais e a tentativa, incompleta, de quebra da coluna vertebral do sindicalismo via flexibilização das leis trabalhistas, o que praticamente anularia seu poder de barganha pela formação de um exército de mão-de-obra de reserva, a chamada “taxa natural” de desemprego.

A mídia oligárquica brasileira, no entanto, não viu maiores problemas na tentativa de continuidade, com José Serra, em 2002, do referido projeto, que, ao fim e ao cabo, ressuscitava a mítica “mão invisível do mercado”. Não se falou, em nenhum momento, em “paixão pelo poder”, no risco de se deixar “a máquina do Estado nas mãos de quem trata o governo e o seu partido como se fossem uma coisa só” e, muito menos, em “escolha dos piores meios para atingir seu fim precípuo: manter-se no poder”.

Ora, o Partido dos Trabalhadores tem tanto direito de escolher um projeto nacional quanto o PSDB. Esse projeto, ancorado, essencialmente, na (i) busca de uma política monetária capaz de equilibrar desenvolvimento e poder aquisitivo – nunca o Brasil cresceu e gerou tantos empregos formais quanto nos últimos oito anos, e nunca tantos cidadãos consumiram tanto -, na (ii) dignidade humana, através do resgate da cidadania via políticas públicas de inclusão social e distribuição de renda – nunca tantos cidadãos, antes condenados ao subemprego ou preteridos por raça, estudaram e prosperaram tanto, e nunca tantos cidadãos, antes condenados a viver abaixo da linha de pobreza, hoje possuem o básico para a conquista de sua autonomia –, na (iii) independência e no protagonismo de sua política externa e, sobretudo, no (iv) respeito ao Estado Democrático de Direito – nunca Imprensa, Legislativo, Polícia Federal e Judiciário, p. ex., foram tão respeitados quanto no governo Lula –, é tão legítimo quanto o tucano. E ele não só tem 80% de aprovação popular como, também, segundo as principais pesquisas, será reeleito, em primeiro turno, para um terceiro mandato.

Por que, então, tanta raiva? Qual a origem desse ódio, que vê na figura do Presidente “um chefe de Estado que despreza a liturgia que sua investidura exige e se entrega descontroladamente ao desmando e à autoglorificação”; que enxerga um chefe de Estado que, por supostamente “ignorar as instituições e atropelar as leis”, serve de mau exemplo à cidadania, este, por certo, se fosse o caso, um “mal a evitar”? Como o Estadão enxerga um mau exemplo num sujeito reeleito democraticamente e com 80% de aprovação popular, que mal consegue andar, onde quer que vá, mesmo em meio a uma dúzia de seguranças? Como um editorial pode ser tão estreito a ponto de sustentar que o objetivo maior do projeto político petista é assegurar “o bem-estar da companheirada”? Por que o Estadão não alertou o Brasil, em 2002, que o projeto de governo tucano objetivava perpetuar-se no poder a fim de assegurar “o bem-estar da tucanagem”?

A origem de tamanho rancor não pode ser, simplesmente, a falácia de que a democracia precisa ser oxigenada através da rotatividade no Poder. Se tal tese carregasse consigo alguma necessidade, não teríamos como livrar a humanidade da estupidez absoluta, uma vez que não haveria explicação para cada Estado Nacional não estampar, no primeiro artigo de sua Carta Máxima, a exigência de que nenhum partido político pudesse ocupar, por duas vezes seguidas, qualquer posição executiva, condão da prosperidade, da harmonia e do desenvolvimento. Sequer eleições seriam necessárias, uma vez que, nesse melhor dos mundos possíveis, bastaria, candidamente, estabelecer-se uma ordem sucessória entre os diversos postulantes aos cargos executivos. Tal como a “mão invisível do mercado” regula a economia e distribui, equitativamente, toda a riqueza produzida, assim agiria, na política, essa espécie de “democracia natural”.

Qualquer analista político é capaz de perceber, numa leitura superficial, que há qualquer coisa, no editorial do Estadão, mas menos uma defesa sistemática da candidatura de José Serra à Presidência da República. Com todo o peso da responsabilidade à qual nunca se subtraiu em 135 anos de lutas, os argumentos do Estado de São Paulo oscilam entre o nada – os supostos méritos do candidato José Serra -, coisa nenhuma – seu currículo exemplar de homem público – e o vazio absoluto – o que ele pode representar para a recondução do país ao desenvolvimento econômico e social pautado por valores éticos.

A verdadeira preocupação do Estadão, ao fim e ao cabo, reduz-se à bisonha e esotérica convicção “de que o candidato Serra é o que tem melhor possibilidade de evitar um grande mal para o País”.

Sim, pois “o que estará em jogo, no dia 3 de outubro, não é apenas a “continuidade de um projeto de crescimento econômico com a distribuição de dividendos sociais”, já que isso – algo que, estranhamente, as elites brasileiras não foram capazes de fazer em 500 anos – “todos os candidatos têm condições de fazer”. O que o eleitor decidirá de mais importante, segundo o Estadão, não é a continuidade ou não do projeto petista de desenvolvimento, mas sim “se deixará a máquina do Estado nas mãos de quem trata o governo e o seu partido como se fossem uma coisa só, submetendo o interesse coletivo aos interesses de sua facção”.

A defesa da candidatura Serra, ensaiada em meio parágrafo, portanto, perde-se num mar de generalidades, e tanto quanto os tímidos elogios às políticas públicas implementadas pelo atual governo – todas elas, diga-se de passagem, relacionadas à era FHC, e não méritos petistas –, desaparece diante do ódio destilado contra a possibilidade de continuidade, com Dilma Rousseff, do projeto petista de desenvolvimento. A impressão que fica não pode ser outra senão a de que a defesa da candidatura oposicionista serve de mero pretexto para o ataque raivoso ao projeto situacionista. Não se trata de um editorial a favor da candidatura José Serra, mas sim contra Lula, o PT e tudo que seu projeto possa representar.

O Estado de São Paulo tem todo o direito – até o dever, alguns dirão – de posicionar-se a favor da candidatura Serra e mesmo contra a petista, desde que apresente bons argumentos em nome da primeira e razoáveis em relação à segunda, uma vez que é público e notório que o projeto petista não é imune a críticas. Só não pode supor que um bom argumento passa, necessariamente, pela desqualificação alheia gratuita.

Do contrário, ao invés de respeito, não conseguirá nada além de transmitir a impressão de que trata o interesse público e seu interesse empresarial como se fossem uma coisa só, submetendo a democracia aos interesses de sua facção. Um jornal que despreza a liturgia que sua investidura exige ao personalizar o debate público e se entrega, descontroladamente, ao desmando e à autoglorificação, não faz mais do que ignorar as instituições e atropelar as leis, deste modo servindo de mau exemplo à cidadania. O Estadão parece ter feito a escolha dos piores meios para atingir seu fim precípuo: manter-se no poder ao lado de nossos velhos conhecidos da mídia oligárquica, desse modo garantindo o bem-estar da companheirada.

Este é o mal a evitar.

* Marcelo da Silva Duarte é mestrando em filosofia e edita o blog www.laviejabruja.blogspot.com
.

Prestígio de Lula sobe e juristas aplaudem críticas à imprensa golpista

.

CORREIO DO BRASIL, de São Paulo – 30 setembro 2010

A aprovação ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva subiu para 79,4% e atingiu novo recorde na série histórica da pesquisa CNT/Sensus, divulgada esta manhã. Essa foi a taxa somada de avaliação positiva verificada pelo levantamento entre os dias 26 e 28 deste mês. Na pesquisa anterior, feita entre 10 e 12 de setembro, a aprovação ao governo era de 78,4%. A aprovação pessoal de Lula, porém, recuou dos 81,4% verificados no início do mês para 80,7%.

O prestígio de Lula segue em alta mesmo após pesadas críticas da mídia conservadora e intelectuais da direita acerca de um comentário do presidente sobre a atuação de veículos da comunicação que integram o grupo chamado Partido da Imprensa Golpista (PIG, ou porco, na sigla em inglês). Em apoio a Lula, um grupo de juristas, que inclui o ex-ministro Márcio Thomaz Bastos, Dalmo Dallari e o ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, lançou em São Paulo, nesta manhã, a Carta ao Povo Brasileiro, cuja finalidade é responder às críticas feitas ao governo e ao presidente pelo Manifesto pela Democracia, divulgado no último dia 22. Segundo os 64 signatários, “nos últimos anos, com vigor, a liberdade de manifestação de ideias fluiu no País. Não houve um ato sequer do governo que limitasse a expressão do pensamento em sua plenitude”.

Os juristas, no texto, repudiam as críticas do Manifesto segundo as quais o presidente da República estaria ignorando a Constituição ao misturar as funções presidenciais com as de líder do PT e ao jogar a opinião pública contra os veículos de comunicação. “Não se pode cunhar de autoritário um governo por fazer críticas a setores da imprensa ou a seus adversários, já que a própria crítica é direito de qualquer cidadão, inclusive do presidente”, consigna o documento.

Na abertura, o documento afirma que “em uma democracia, todo poder emana do povo, que o exerce diretamente ou pela mediação de seus representantes eleitos…” Pouco adiante, sustenta que “em uma democracia as decisões populares são preservadas por instituições republicanas e isentas” – e menciona “o Judiciário, o Ministério Público, a imprensa livre, os movimentos populares, as organizações da sociedade civil, os sindicatos, dentre outras”.

Em oito parágrafos, a Carta afirma que o governo “jamais transigiu com o autoritarismo” e “não se deixou seduzir pela popularidade a ponto de macular as instituições democráticas”. Enfatiza, também, que o governo “sempre escolheu para chefe do Ministério Público Federal o primeiro de uma lista tríplice elaborada pela categoria e não alguém de seu convívio ou conveniência”.
.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

O DEBATE DA RECORD

.

JORNAL DO BRASIL, em Últimos Posts - Enviado por: Migliaccio

Vocês viram o debate de domingo na Record? Foi um aperitivo do que vai ser quinta-feira à noite, na Globo.

Adoro debates presidenciais. Ainda lembro quando, em 89, me arrepiei ao ver, sentados lado a a lado, Lula, Brizola, Maluf, Covas, Ulysses Guimarães, Aureliano Chaves, Ronaldo Caiado, Afif, Gabeira (Collor não foi). Depois de 20 anos de ditadura, censura, parlamentares biônicos, e prefeitos e governadores nomeados por presidentes militares, aquela imagem foi um colírio para os olhos de quem, aos 25 anos, era apresentado finalmente à democracia.

Bom, o debate de domingo passado.

Plínio, Dilma, Serra e Marina. Lá estavam personagens, não pessoas. Cada um com 20% verdadeiros de si, 40% de ideologia e retórica e outros 40% da interpretação que eles acham que vai convencer o eleitor a votar neles.

Complicado?

Não, não, veja:

Serra se apresentou relaxadão. Sorridente, jovial, lindo, leve e solto. Não transpareceu uma gota de apreensão pela derrota iminente. Portou-se como um franco atirador, argumentou calmamente, o que é um grande feito num debate presidencial transmitido ao vivo para milhões de pessoas. Já perdeu (garante a Mãe Dinah).

Dilma estava uma pilha de nervos. Se calma ela já não é uma grande oradora, imagine nervosa. Respira mal, come o final das frases, parece se perder no encadeamento de ideias. Se for tão boa para administrar como é diante de um microfone, estamos fritos. Mas muitos ótimos administradores, como Darcy Ribeiro, o melhor secretário de Educação que o Rio já teve, eram ruins no palanque. Por isso, aliás, Darcy conseguiu ser derrotado por um gato angorá numa eleição para governador. Gato esse que hoje tem um belo cargo no atual governo...

O decente Plínio é nosso pândego stalinista. Septuagenário com arroubos de estudante universitário, mistura palavras de ordem com saraivadas de críticas aos adversários. Como a plateia ri e aplaude, ele fica ainda mais saidinho. Disse que vai colocar o salário mínimo a R$ 2 mil, só não explicou como a prefeitura de Macaxeira do Norte pagará isso ao seu funcionalismo público. Moleque-ancião-travesso, Plínio protagonizou a melhor cena do debate, quando pregou na testa da Marina Silva o rótulo de demagoga e falsa.

Marina não sai do tom. Não olha para os lados. Monocórdia, desfia seu texto de reserva moral do país. Seu personagem é, de longe, o mais sem graça, o menos humano desta eleição. Todos os candidatos, mais cedo ou mais tarde, se revelam. Só Marina não tira aquela máscara de ser humano perfeito e irrepreensível. Evangélica da Assembleia de Deus, defensora do meio ambiente, séria. Será que ela vai ao banheiro?

Prefiro alguém de carne e osso, com defeitos e qualidades, como todo ser humano.

Dilma não consegue esconder que é mal humorada, centralizadora e dona da verdade. Pode até vir a ser uma boa presidente, mas eu não gostaria de trabalhar diretamente com ela. Deve encher o saco.

Serra, apesar de todo o seu palavrório e de suas expressões afáveis, acaba mostrando que também é mal humorado e que é tucano-aristocrata até o fundo da alma. Pede para ser chamado de Zé, como se fosse possível tratar a oligarquia quatrocentona paulista com aquela intimidade de porta de botequim. Aliás, Serra diz que foi perseguido pela ditadura, mas saiu do Brasil para morar nos Estados Unidos. Que subversivo era esse? E voltou ao país em 1978, um ano antes da anistia.

Pelo menos, todos eles são honestos. Cada um com sua visão de mundo, cada um representando seu grupo, não creio que nenhum deles vá tirar dos cofres públicos para colocar no bolso.

Já quanto aos seus colaboradores do segundo, terceiro escalão...

Mas, para isso, que infelizmente é inevitável em qualquer governo, de qualquer país, em qualquer regime, temos polícia e cadeia.
.

Ex-assessor da Casa Civil permanece calado em depoimento à Polícia Federal

.

JORNAL DO BRASIL – PORTAL TERRA – 29 setembro 2010

Brasília - O advogado Emiliano Aguiar orientou seus clientes Vinicius Castro e Sônia Castro a permanecerem calados durante o depoimento à Polícia Federal nesta quarta-feira (29). Vinicius e Sônia, filho e mãe, são acusados de envolvimento em um suposto tráfico de influência na Casa Civil.

"Eu aconselhei meus clientes a, nesse momento inicial, permanecerem em silêncio, porque não é possível saber qual é a motivação política dessas personagens que passaram informações para a imprensa. Nesse momento, o melhor para a defesa é esperar se desenhar o cenário e as investigações avançarem", disse Aguiar. O advogado disse que a intenção é "evitar a distorção da verdade". Questionado se o momento ao qual se referiu teria relação com a realização das eleições, negou, dizendo que se referia apenas ao momento inicial das investigações. "Meus clientes continuam convictos de que não fizeram nada errado", afirmou.

Vinicius pediu exoneração do cargo de assessor da pasta após a divulgação das denúncias e Sônia seria 'laranja' da empresa que teria feito lobby a favor de empresas privadas junto a órgãos do governo.
.

MOÇAMBIQUE – LIÇÕES DE UM E DOIS DE SETEMBRO DE 2010

.

OLÍVIA MASSANGO – O PAÍS ONLINE

A descarga emocional deu-se porque o homem recuperou o seu instinto natural, porque a sociedade não o ajuda a realizar-se. E aqui reside o perigo, porque, com um comportamento natural, este pode dissolver a sociedade. E esta é uma grande lição Sr. Presidente.

“Contra a inimizade do povo um príncipe jamais pode estar garantido”, Maquiavel

“Se houver demasiadas pessoas pobres e apenas algumas pessoas ricas, não podemos acabar com os ladrões, não podemos acabar com os roubos. A maneira de acabar com isso é com uma sociedade onde toda a gente tenha o suficiente para satisfazer as suas necessidades e ninguém acumule desnecessariamente só por ganância”, Osho

Não há dúvidas que os dois primeiros dias do mês de Setembro pintaram de preto umas boas páginas da história da cidade e província de Maputo. Mas pior é a marca que fica na memória dos que testemunharam a ira de um povo saturado do desamparo, ou simplesmente da orfandade, como desiludidamente descreveu o seu sentimento o escritor moçambicano Mia Couto.

O grito começou surdo, numa espécie de declaração de intenções, com recurso a mensagens. O anúncio já era do conhecimento geral. A um de Setembro entrariam em vigor as novas tarifas de água e luz, e como se não bastasse, para completar o trio de ataque ao bolso do cidadão, anunciou-se também o agravamento do preço do pão, em um metical, para o dia seis do mesmo mês. Ainda assim, isto não era o pior, porque o inferno mesmo já era o pão duro que a cada dia se lhes negava aproximar à mesa. Seis de Setembro era o dia do aumento formal, porque, na prática, os aumentos já se tinham verificado, deixando a data apenas com o estatuto de oficial.

Além do pão, o arroz, o feijão, o amendoim, a batata, o óleo, o leite, entre outros produtos de primeira necessidade, há mais de um mês que não se juntavam para dar ao povo o mínimo de calorias diárias exigidas para o consumo humano. Isto sem falar da gestão sofrida de toda a economia doméstica, que a cada dia vivia o drama da meia manta para cobrir uma família. E a razão parece ser simples: inflação, conjuntura internacional, fraca produtividade, etc., tudo o que no vocabulário do povo se traduz em fome e sofrimento. Porque estes não precisam de muita escola para saber dizer o que está bem e mal nas suas vidas, diferentemente dos nossos pseudo-governantes que, mesmo com muita escola, ainda precisam de muita assessoria para dirigir. O que prova que na época do liceu ou não aprenderam nada, ou esquecerem tudo. Mas que o estouro do povo sirva de lição e faça ressuscitar todas as letras mortas.

O problema surge à partida. É que os nossos políticos vivem da política e não para a política. O poder em sua posse é a pior droga que se lhes atribui, com o agravante de ser em doses altas e, por vezes, por longos períodos. Assimilam apenas a manha da “enganação”, através de discursos futuristas, mas sem sustentação prática.

Recuemos. A génese deste desabafo social não está na alta dos preços em si. está na fraca produtividade do país, associada à fraqueza das políticas, que também pecam por serem desarticuladas, na maioria das vezes. Ao ministro da Agricultura, a crítica cai-lhe que nem uma luva. Para este, é fácil apregoar que o nosso governo drena 8% do Orçamento do Estado ao sector que dirige, quando as contas provam que ainda estamos a menos de 6%. O populoso discurso da “Revolução Verde” não só perdeu força teórica, como também está sendo sepultado no atravessar de cada dia.

Preços altos, especialmente de produtos de primeira necessidade, não deviam ser o problema de um país com mais de 35 milhões de hectares de terra arável e com elevado potencial agro-ecológico.

Mas a culpa maior não está com os pupilos, está com o chefe máximo, o Presidente da República, que se esquece que o poder que tem deriva de um contrato social com a sociedade, que legitima o poder que exibe como ninguém. Está nele, que provou estar despreparado ou destreinado para lidar com adversidades como uma revolta popular. A aparente impotência governativa revelou-se não apenas na sua aparição tardia aquando das manifestações, mas também na frieza com que se dirigiu ao povo. Não houve sintonia Sr. presidente.

Não houve sentimento nas letras lidas, senão um amontoado de palavras gastas. O momento pedia novidade, improviso, ainda que previamente projectado, mas que transmitisse alguma proximidade com a sociedade e a ideia de que são palavras saídas do coração. Não necessariamente para dizer que os preços vão baixar por via de subsídio, porque está claro que essa não é a solução. Mas pelo menos para dizer que estamos juntos neste sofrimento e, como prova disso, anunciar uma medida sensata, como, por exemplo, o corte em algumas despesas do Estado para drenar o dinheiro à construção de bases para uma economia mais produtiva. Faltou a assumir o compromisso de, a médio prazo, fazer acontecer os planos de “barbas brancas” há muito elaborados para aumentar a produção. Faltou o Yes We Can de Barack Obama, ou melhor, faltou o renovar da esperança. Faltou um novo pacto, isto é, faltou lançar sementes que fizessem brotar uma nova relação com o povo.

Os preços não têm culpa Sr. Presidente. Para serem altos ou baixos, dependem da oferta. Enquanto não produzirmos, seremos sempre vítimas dos preços altos. Mas, para o povo, não basta dizer isso. É preciso resgatar a simplicidade e fazer uma comunicação individual, para atingir o colectivo. Povo é uma expressão simbólica de um conjunto de seres humanos diferentes, apesar de se lhes poderem encontrar semelhanças. Com uma mensagem humana e sincera, cada cidadão ficava atingido e encorajado a colocar a mão na massa. O problema do discurso político preguiçoso é que ele sacrifica o indivíduo em nome do povo, quando este é que é o valor mais alto do povo. É pensando no indivíduo que se devem traçar políticas para o povo, porque a satisfação é individual.

A descarga emocional deu-se porque o homem recuperou o seu instinto natural, porque a sociedade não o ajuda a realizar-se. E aqui reside o perigo, porque, com um comportamento natural, este pode dissolver a sociedade. E esta é uma grande lição Sr. Presidente.

Não se brinca com a ira de um povo. No dia 5 de Fevereiro de 2008, fez-se a primeira demonstração de força popular. Foi o primeiro sismo social - como o classificou o sociólogo moçambicano Carlos Serra - que o governo preferiu não enfrentar, acobardando-se nos subsídios às gasolineiras, para evitar o agravamento do transporte semi-colectivo. Péssima saída, tanto para o governo, como para o povo. A reedição desta data foi muito mais intensa e, para ser genuíno, o governo precisa de mestria na acção e não apenas inteligência.

Se no fim do seu primeiro mandato e no princípio do segundo, Armando Guebuza viveu experiências que nenhum outro presidente moçambicano experimentou, que estas sejam uma grande lição para ele e seus sucessores, porque o povo descobriu que o grande poder é o seu. Assim sendo, para quem aspira o poder, convém lembrar sempre a célebre frase de Maquiavel: “Um homem prudente deve seguir sempre as sendas percorridas pelos que se tornaram grandes, e imitar aqueles que foram excelentes”.
.

Guiné-Bissau - Semana de decisões vai dominar regresso dos líderes

.

RODRIGO NUNES – PNN - LUANDA DIGITAL – 29 setembro 2010

Luanda – As comemorações dos 37 anos da independência da Guiné-Bissau ficaram marcados pela falta de comparência dos dignitários políticos e militares do país.

A ausência das figuras do Estado foi justificada oficialmente com compromissos internacionais. O Presidente Malam Bacai Sanhá deslocou-se a Nova Iorque para participar na Assembleia Geral da ONU, o Primeiro Ministro Carlos Gomes Júnior à China para inauguração do pavilhão guineense na Expo Shangai e o CEMGFA António Indjai e o Presidente da Assembleia Nacional Popular Raimundo Pereira ao Mali. Apesar das justificações oficiais, fontes diplomáticas em Bissau contactadas pelo Luanda Digital confirmaram que as verdadeiras razões estarão relacionadas com a procura de soluções internacionais para a instabilidade crónica dos sectores políticos e, sobretudo, militares guineenses.

Em Bissau, os rumores de regresso de Bubo Na Tchuto à Chefia militar da Marinha ganham força a cada dia que passa. Desde 01 de Abril que Bubo tem utilizado a sua liberdade para criar alianças que lhe tem permitido o reassumir do controlo das FA’s. A estratégia desenvolvida permite já a Bubo desafiar abertamente o líder dos revoltosos de Abril, António Indjai, exigindo deste a sua nomeação como comandante da Marinha.

“O Bubo tem vindo a forçar a sua posição e a aproveitar-se da inoperância habitual dos poderes políticos e judiciais guineenses. Conseguiu, quer por medo, quer por pressões, ser ilibado pelos Tribunais de todos os crimes de que era acusado e ainda obrigou Indjai, que o tinha forçado ao exílio na Gambia em 2008, a aceitar a sua reintegração sem quaisquer condições”, referem fontes diplomáticas na capital guineense ouvidas pelo Luanda Digital. As mesmas fontes referem ainda que a confirmar-se a reintegração de Bubo na Marinha, “o afastamento compulsivo de António Indjai e o restabelecimento das redes de ‘interesses’ que dominaram os últimos anos da Guiné-Bissau será uma certeza a breve prazo”, concluem.

A ausência das autoridades guineenses é por isso entendido como uma “tentativa desesperada” de recolherem apoio junto da Comunidade Internacional para evitar a concretização deste cenário. O Luanda Digital sabe que quer junto da ONU, da CEDEAO e da Comissão Europeia, foram feitos apelos pelas autoridades políticas guineenses para a entrada em Bissau de um contingente militar de Estabilização, justificados como “a única forma de impedir nova onda de instabilidade no país e combater de forma eficaz o regresso do narcotráfico”.

Os sinais em Bissau mostram a necessidade deste “contra-relógio” por parte das autoridades guineenses democraticamente eleitas. No passado sábado, a Comissão Militar de Avaliação angolana que estava na capital da Guiné-Bissau no âmbito de uma acção de cooperação técnico-militar com as FA’s Guineenses foi “convidada” a abandonar o país por Bubo Na Tchuto, oficialmente “apenas” conselheiro no Ministério da Defesa. “A missão angolana tinha uma estadia prevista de duas semanas para avaliar as necessidades guineenses. Mas ao fim de uma semana de trabalhos, a sua saída foi inesperadamente antecipada, tendo o Bubo afirmado que todo o trabalho já estava feito. O que faltava ver, se calhar, não convinha ao senhor Contra-Almirante”, confirmaram, já em Luanda, elementos da delegação lesada.

Apesar de considerar este incidente como uma “afronta”, Angola continua a mostrar-se disposta a apoiar o poder político guineense, de forma a defender os interesses escolhidos pelo povo nas últimas eleições. A participação de Angola numa missão de Estabilização na Guiné-Bissau é tida como uma “certeza” por responsáveis da Cidade Alta em Luanda, contando com o apoio tácito dos outros países da CPLP, nomeadamente Portugal, a ex-potência colonial da Guiné-Bissau, da União Africana e da CEDEAO.

Esta “certeza” assenta no facto de Angola se apresentar como o único país capaz de disciplinar as FA’s guineenses, inibindo-as de manter o monopólio do narcotráfico no país.

Com regresso previsto a Bissau para os próximos dias, as autoridades guineenses irão agora apresentar as conclusões e estudar as soluções oferecidas. Em causa estará a regresso da Guiné à Comunidade Internacional ou a continuação da política “Zig-Zig” que tem afundado o país, entre assassinatos, narcotráfico e tentativas de golpes de Estado. As próximas semanas serão, por isso, decisivas para o país.

Rodrigo Nunes (c) PNN Portuguese News Network
.

PRESIDENTE ANGOLANO DEMITE MINISTRO DO INTERIOR

.

PANAPRESS – 29 setembro 2010

Luanda, Angola (PANA) - O chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos, demitiu o ministro Interior, o general Roberto Leal Monteiro "Ngongo", na sequência da extradição ilegal de um cidadão português de São Tomé e Príncipe para Angola, indica um comunicado da Presidência da República publicado terça-feira em Luanda.

O cidadão português Jorge Manuel dos Santos Oliveira foi extraditado de São Tomé e Príncipe para Angola a fim de ser submetido a um processo judicial por alegada fraude contra uma empresa de direito angolano supostamente pertença do empresário Mello Xavier, que é também deputado do partido no poder, o MPLA.

Segundo fontes seguras, Jorge dos Santos Oliveira foi retirado de São Tomé e Príncipe para Angola, em finais de 2009, por agentes da Polícia angolana que realizaram esta operação sem autorização das autoridades.

Um comunicado da Casa Civil do Presidente da República, publicado domingo à noite, indicava que, "não existindo um acordo de extradição entre os dois países e não tendo havido autorização judicial de qualquer autoridade competente de São Tomé e Princípe, o referido processo de extradição foi considerado irregular e ilegal".

A nota acrescentou que o Ministério angolano do Interior reconheceu o "grave erro" e que o ministro Roberto Leal Monteiro seria exonerado das suas funções.

Nomeado em Fevereiro de 2010 na chefia do Ministério do Interior, o general Ngongo já exerceu, entre outros cargos, os de vice-ministro da Defesa, de chefe do Estado-Maior adjunto das Forças Armadas e de embaixador na Rússia.-->
.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

A VENEZUELA BOLIVARIANA EM NOVO CENÁRIO

.

JÚLIO FERMIN * – OUTRAS PALAVRAS

Ainda antes de se realizarem as eleições para a Assembleia Nacional da Venezuela, quase todos os analistas políticas concordavam sobre sua importância. Estava certo, também que o resultado seria um parlamento mais plural

Nas eleições legislativas anteriores, realizadas em 2005, a oposição retirou-se, argumentando suposta falta de garantias democráticas. Mais tarde, os opositores reconheceram que foi um grave erro político, devido ao qual se autoexcluíram do que é, em qualquer país, o cenário principal do debate político.

Além disso, as eleições do domingo (26/9) romperam também o paradigma dos processos eleitorais que tradicionalmente não mobilizam a cidadania. Pela segunda vez, ocorreram separadas do pleito presidencial. Na ocasião anterior, em 2005, apenas 25,26% dos eleitores compareceram.

Desta vez, estavam convocados 17 milhões de venezuelanos e venezuelanas. A participação foi maciça, um índice superior a 65%. Ainda que distante dos processos eleitorais dos anos 1960 a 1980, quando a participação superava os 90%, o número é expressivo. Nos últimos onze anos de processo bolivariano, o sistema eleitoral teve de suportar duros ataques e questionamentos da oposição, que repercutiram na participação do eleitorado.

São inúmeros os testemunos de observadores nacionais e internacionais em favor do sistema eleitoral venezuelano, considerado um dos mais avançados do mundo. Em parte, devido a sua automatização, próxima de 100%, mas também graças à participção de milhares de pessoas, tanto das organizações políticas quanto dos meios de informação, funcionários de todos os poderes, incluindo o organizmo eleitoral. Além disso, deve-se levar em conta a participação cidadã, já que os coordenadores de centros eleitorais e membros das mesas coleta dos votos são cidadãos escolhidos por sorteio, antes de cada processo eleitoral.

O que estava em jogo para as forças da Revolução bolivariana

Nestas eleições, elegeram-se 165 deputados e deputadas, numa eleição que combinou disputa nominal e por lista. Ou seja, elegeram-se deputados por nome e sobrenome nas 87 circunscrições eleitorais, enquanto outro grupo foi escolhido por partido ou organização política, de forma proporcional à população da zona eleitoral. Também foram eleitos deputados ao parlamento latinoamericano y representantes indígenas para a Assembleia Nacional.

Ela é um órgão fundamental no sistema democrático venezuelano. Entre suas funções principais encontram-se, além de exercer controle sobre o Executivo, eleger e designar os magistrados que integram o Tribunal Supromo de Justiça (TSJ); dos dirigentes do Conselho Nacional Eleitoral; e dos membros do Poder Cidadão: Defensor do Povo, Controlador Geral da República e Fiscal Geral da República.

No entanto, nesta eleição as metas das forças políticas em disputa iam além de obter maioria.

O Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), em aliança com o Partido Comunista (PCV), tinha como ponto de honra alcançar a maioria qualificada. Ou seja, um mínimo de 110 deputados e deputadas (2/3 do total), que lhe permitiriam, entre outras coisas, remover magistrados do TSJ; nomear os membros do Poder Eleitoral e Poder Cidadão; convocar uma Assembleia Nacional Constituinte e promover reformas constitucionais. Também se exigem pelo menos 99 deputados (3/5 do total) para aprovar um voto de censura ao vice-presidente e votar as Leis Orgânicas.

O avanço da oposição

De sua parte, a oposição, qualquer que fosse o resultado, obteria representação no palco tradicional para o debate político do país.

Para esta eleição, os distintos partidos opositores, que separados não superam 10% das intenções de voto, propuseram-se alcançar a “unidade perfeita” não obtida em processos anteriores. Para tanto, formaram uma frente, denominda Mesa de Unidade Democrática (MUD). Escolheram candidatos únicos para cada zona eleitoral – embora cada partido disputasse por sua própria legenda o voto proporcional.

Não se pode deixar de destacar este fato, que significa algo mais que mera estratégia eleitoral. Por um lado, a oposição “assume a institucionalidade”, ou seja, reconhece a legitimidade do sistema político venezuelano e valida o sistema eleitoral, que em outras ocasiões procurou desqualificar. Assume, ao mesmo tempo, a condição de porta-voz de setores da população que nutrem certo descontentamento com as políticas do governo. Mas este fato pode ter efeito positivo sobre a qualidade do debate político e o exercício de controle social sobre as políticas públicas.

Ainda que esta fato não tenha diso destacado no processo, a maior parte dos governadores e prefeitos compreendeu a necessidade de orientar suas políticas, de maneira prioritária, para a inclusão social dos setores mais pobres, assim como debater prioritariamente temas como alimentação, educação e saúde. Ao fazê-lo, alinharam-se de algum modo com as políticas do Executivo. Neste processo, muitos dos governantes estaduais e municipais participaram ativamente na campanha, na condição de militantes partidários, ainda que criticassem a participação do presidente Chávez, presidente do PSUV.

Tendências e resultados

Com grande atraso, após as 2 da madrugada de 27 de setembro, o Conselho Nacional Eleitoral anunciou os primeiros resultados, que dão 91 deputados ao PSUV (muito menos que o partido esperado), 59 à oposição (também menos que o esperado) e 2 deputados para o Partido Pátria para Todos (PPT). Em consequência, será preciso chegar a acordos, para aprovar leis orgânicas e produzir outras decisões.

Ao observar os resultados totais, haverá duas maneiras de analisá-los: a) o PSUV ganhou em 18 estados; b) A oposição obteve 52% dos votos totais. A realidade é que o PSUV já não terá a maioria absoluta. A votação para o Parlamento Latinoamericano resultou em 43% de votos para o PSUV e 45% para a MUD.

Os resultados confirmam uma tendência que vem se desenvolvento nas eleições desde 2007.

O eleitorado comporta-se de maneira distinta quando está em jogo a figura presidencial. Nos pleitos que envolvem referendo revogatório de mandatos, eleição presidencial, ou a emenda recente que permite a reeleição contínua, os venezuelanos participam maciçamente e cerca de 60% posicionam-se ao lado de Chávez. Já nas eleições parlamentares, de governadores, prefeitos, etc, a situação muda e a tendência é mais dispersa.

Este fenômeno configura-se de maneira clara a partir de 2007. Nesta eleição, como se recorda, as forças políticas que apoiam o presidente Chávez propuseram a Reforma Constitucional e perderam pela primeira vez nas urnas, por uma margem muito estreita (inferior a 1%).

Já no ano seguinte, nas eleições para governadores, prefeitos e conselhos legislativos regionais, a aliança vermelha continuou obtendo a maioria da votação nacional – mas os números começaram a se reverter em favor da oposição. No Distrito Federal e nos Estados de Zulia, Miranda, Lara, Carabobo, Anzoátegui e Táchira – onde estão as cidades mais populosas – foram eleitas autoridades de organizações opositoras.

Agora, o PSUV recuperou-se no Distrito Federal, Lara e Carabobo, obtendo a maioria dos postos em disputa. No entanto, em outros casos a tendência repetiu-se ou se ampliou. Por exemplo, em Zulia a oposição elegeu 13 deputados, de 15 possíveis.

Por um lado, assim a oposição tende à convergência, que se concretizou na Mesa de Unidade Democrática. Já as forças políticas da revolução bolivariana têm se dispersado, à medida em que o tempo passa. A Assembleia eleita em 2005 era 100% favorável ao processo político impulsionado por Chávez. Agora, o PSUV só mantém o apoio do Partido Comunista da Venezuela. Sua divisão mais recente é a fundação do PPT, que aposta na despolarização e quer se converter no fiel da balança.

Por fim, o governo bolivariano, apesar das debilidades e erros da oposição, está sempre sabotando a si mesmo. Sofre a falta de eficiência e eficácia na gestão pública, como demonstrou a escassez de energia elétrica. Embora poucos, os casos conhecidos de corrupção administrativa foram muito significativos – como o que se deu na empresa estatal de produção e distribuição de alimentos, PDVAL. E não foi capaz de enfrentar algo muito crítico para toda a sociedade: o descontrole da criminalidade e a debilidade das políticas de segurança cidadã.

O PSUV já havia reconhecido parcialmente suas debilidades e dificuldades: a maior parte dos deputados e deputadas atuais não foram apresentados como candidatos. O partido apostou em lideranças joves e alguns representantes de movimentos sociais, todos eleitos pela base.

O fato de a oposição ter alcançado 52% dos votos é um alerta para o projeto político da Revolução Bolivariana, tendo em vista as eleições municipais de 2011 e talvez o pleito presidencial do ano seguinte. Talvez esteja na hora de retomar a aplicação dos três “Rs” propostos pelo presidente Chávez em 2007: Revisar, Retificar e Reimpulsionar.

* Julio Fermín é membro da Equipe de Formação, Informação e Publicações (EFIP), de Caracas. Foi um dos animadores do Fórum Social Mundial 2006, capítulo Venezuela. É colaborador da Agência ALAI, onde este texto foi originalmente publicado.
.

Presidenciais Brasil - DEVER CÍVICO NO EXTERIOR

.

ANTONIO TOZZI – DIRETO DA REDAÇÃO

Neste sábado, 24 de setembro, dezenas de brasileiros trocaram o descanso pelo cumprimento do dever cívico. Eles lotaram a Sala Machado de Assis do Consulado Geral do Brasil em Miami para participar de um mini treinamento sobre as eleições 2010.

Eleições não. Eleição, porque aqui no Exterior somente é possível votar em presidente da República, uma vez que os demais cargos não são colocados na cédula por uma questão óbvia: no exterior há brasileiros de todas as partes do país, portanto seria complicado confeccionar uma cédula que contemplasse candidatos de todos os estados.

Apesar da lógica, particularmente defendo pelo menos a inclusão dos cargos majoritários na cédula. Algo que, comenta-se, pode estar sendo considerado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para as próximas eleições. E também a eleição de um parlamentar que represente as comunidades de brasileiros que vivem no Exterior.

Vale notar que, a exemplo do que ocorre no Brasil, os mesários são voluntários e participam do processo eleitoral em nome do civismo. Até porque aqui não há a prerrogativa de pedir uma compensação junto ao patrão por ter trabalhado gratuitamente para a Justiça Eleitoral. Os voluntários, porém, não se queixam por estarem cientes de estarem contribuindo com o processo eleitoral.

Os procedimentos seguem as instruções do TSE, com exceção de alguns itens que não são aplicáveis àqueles que moram fora do Brasil. A eleição obedece ao mesmo horário brasileiro – iniciando às 8 horas da manhã e se encerrando às 5 horas da tarde, com os mesários cumprindo todas as determinações contidas no manual e seguindo as orientações dos responsáveis pela Justiça Eleitoral, que, no caso dos EUA, são os funcionários do Consulado.

A novidade deste ano é a exigência de o eleitor portar um documento de identificação com foto para ser apresentado junto com o título eleitoral antes de entrar na cabine de votação. Isto vem sendo veiculado com insistência para que o eleitor não perca a oportunidade de votar em seu candidato nem perder a viagem – que pode ser longa, pois a área de abrangência é bastante ampla, uma vez que a zona eleitoral de Miami congrega todo o estado da Flórida e também Porto Rico.

Os mesários precisam chegar às 7 horas da manhã ao local de votação, que, a exemplo da última eleição, será realizada em uma das dependências do Miami Dade Community College, no centro da cidade de Miami, no domingo, 03 de outubro. Esta hora de antecedência é exigida para que os mesários possam estar a postos antes da chegada dos eleitores e para cumprir os procedimentos determinados pelo TSE, a fim de garantir a lisura e a isenção da eleição.

O total de eleitores é de cerca de 10 mil na Flórida, o que pode ser considerado pequeno uma vez que se calcula existir perto de 300 mil brasileiros morando neste estado americano. Muita gente se esquece de cumprir seu dever cívico depois que se muda para o exterior. E o TSE faz campanha de conscientização veiculando mensagens através das emissoras que transmitem suas programações para os EUA e também por meio da imprensa brasileira local.

Agora, só resta esperar que tenhamos uma eleição bem tranquila e os brasileiros que vivem no Exterior sentem que ao depositar seus votos na urna eletrônica também estão contribuindo com o processo cívico brasileiro.

Como eu sei disto tudo? É simples. Sou um dos mesários voluntários!

* Foi repórter do Jornal da Tarde e do Estado de São Paulo. Vive nos Estados Unidos desde 1996, onde foi editor da CBS Telenotícias Brasil, do canal de esportes PSN, da revista Latin Trade e do jornal AcheiUSA.
.

Brasil - Dilma fecha campanha com apelo à serenidade e a falar à classe média

. A Candidata do PT prometeu erradicar a pobreza no Brasil (Fernando Donasci/Reuters)

PÚBLICO – 28 setembro 2010

Dilma Rousseff fechou ontem a campanha eleitoral às presidenciais brasileiras a pedir serenidade. Ao lado de Lula, apelou ao voto na “continuidade”. Prometeu erradicar a pobreza e falou à classe média. Hoje, uma sondagem aponta para a queda da candidata petista em todas as regiões. Aumentam as hipóteses de uma segunda volta.

A seis dias da primeira volta da eleição presidencial, no Brasil, a candidata do Partido Trabalhista (PT) encerrou a campanha no estado de São Paulo, na segunda-feira, a dirigir-se à classe média e a prometer derrotar o ódio que diz ter sido característica da campanha eleitoral.

Num apelo à serenidade, e rodeada de apoiantes paulistas, Dilma Rousseff apelou ao voto na continuidade das políticas do Presidente Lula da Silva, que subiu ao palanque do comício para ouvir a sua antiga chefe da Casa Civil dizer: “Queremos que o Brasil inteiro seja composto por classe média forte, pujante.”

Perante os milhares que lotaram o sambódromo onde decorreu o comício na capital económica brasileira, Dilma assumiu a “promessa de erradicar a miséria e de fazer deste país uma nação e um povo desenvolvidos.”

No discurso final, nenhum dos oradores fez referência aos casos de alegada corrupção que envolvem o Governo de Lula – a violação de sigilo da Receita Federal e a saída da sucessora de Dilma da Casa Civil, Erenice Guerra –, temas que entraram nas últimas semanas de campanha eleitoral.

Dilma perde vantagem sobre a soma de Serra e Marina

Já hoje, a mais recente sondagem revelada pelo diário "Folha de São Paulo" confirma a tendência de queda de Dilma desde a segunda semana de Setembro. A candidata petista recuou para os 51 por cento de votos válidos, quando, há cinco dias, estava na casa dos 54 por cento.

A candidata do PT regista assim uma queda de dois pontos sobre a vantagem que detém sobre a soma dos dois outros candidatos, José Serra, do Partido da Social Democracia Brasileira, e Marina Silva, dos Verdes.

A ida a uma segunda volta ou a consagração à primeira dependem da margem de erro, que se situa nos dois por cento – para mais ou para menos.

Isto significa que, considerando os votos válidos, se Dilma ficar nos 49 por cento, vai ser obrigada a disputar uma segunda volta com José Serra. Mas se alcançar os 53 por cento, dispensa nova votação.

Serra cresce positivamente, de 31% para 32%. E Marina Silva passa dos 14 para os 16 por cento.

A sondagem da Datafolha para o jornal de São Paulo mostra ainda que a candidata do PT oscila de forma negativa em todos os estratos da população e em todas as regiões do Brasil.
.

Petróleo: Angola é o maior fornecedor da China, ultrapassando Arábia Saudita

.

AC – LUSA

Pequim, 28 set (Lusa) – Angola tornou-se o maior fornecedor de petróleo à China, ultrapassando a Arábia Saudita, anunciou hoje um jornal de Pequim.

Em agosto, Angola exportou para a China 3,99 milhões de toneladas de petróleo, o que correspondeu a “mais de 19 por cento do total das importações chinesas” naquele domínio, disse o Global Times, citando estatísticas das Alfândegas da China.

Em declarações àquele jornal, o ministro da Indústria angolano, Joaquim David, indicou que a capacidade de produção de Angola pode exceder os dois milhões de barris por dia, mais do que a quota fixada pela OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), mas não confirmou se isso estava a acontecer.

“Instruímos, de facto, as companhias petrolíferas a respeitarem a quota, mas não posso comentar se elas conseguem fazer isso”, afirmou Joaquim David.

Na semana passada, uma agência noticiosa norte-americana disse que Angola estava a produzir em média 1,9 milhões de barris de petróleo por dia, mais do que os 1,65 milhões fixados pela OPEP.

Aquela matéria-prima representa quase metade do Produto Interno Bruto de Angola, mas, segundo Joaquim David, “o país está a trabalhar para diversificar a sua economia e reduzir a dependência em relação ao setor petrolífero”.
.

A BANHA DA COBRA DE CRAVINHO

.

ORLANDO CASTRO, jornalista – NOTÍCIAS LUSÓFONAS

João Gomes Cravinho considera, segundo a Lusa, que a grande mais valia de eleger Portugal para o Conselho de Segurança das Nações Unidas é garantir uma “voz” pelos que estão fora dos círculos de poder. Ou seja, Lisboa quer que o mundo olhe para o que diz e não para o que faz.

O secretário de Estados dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, considera que Portugal representa “a voz daqueles que não estão nos círculos mais poderosos da governação mundial. Não estamos no G-8, não estamos no G-20, fazemos parte do G-172”, que engloba todos os outros países”.

Se alguém acreditar... que o compre. É que, em Portugal, o governo socialista de José Sócrates não dá, nem permite que alguém dê, voz a quem a não tem. Limita-se, isso sim, a ampliar a voz dos que já a têm em tudo quanto é sítio.

Quando no passado dia 18 de Janeiro, João Gomes Cravinho afirmou que o Governo acompanha com a «atenção normal» a situação na «província angolana de Cabinda», defendendo que o importante é a detenção de responsáveis de ataques criminosos, estava de que lado? Dos que não têm voz não era com toda a certeza.

Lisboa esquece-se, continua a esquecer-se, que os cabindas, tal como os angolanos, não têm culpa que as autoridades portugueses tenham, em 1975, varrido a merda que criaram para debaixo do tapete.

Quando interrogado sobre se o Governo português considerava preocupantes as notícias de detenções de figuras alegadamente ligadas ao movimento independentista na colónia angolana de Cabinda, João Gomes Cravinho afirmou que «preocupante é quando há instabilidade e violência, como aconteceu com o ataque ao autocarro da equipa do Togo» a 8 de Janeiro de 2010.

Sim, é isso aí. Portanto, o MPLA pode prender quem muito bem quiser (e quer todos aqueles que pensam de maneira diferente) que terá, como é óbvio, o apoio e a solidariedade das autoridades portuguesas que agora dizem querer dar voz aos que estão fora do círculo do poder.

Creio, aliás, que tal como fez em relação a Jonas Savimbi depois de este ter morrido, Gomes Cravinho não tardará (provavelmente só está à espera que eles morram) a chamar Hitler, entre outros, a Raul Tati, Francisco Luemba, Belchior Lanso Tati, Jorge Casimiro Congo, Agostinho Chicaia, Martinho Nombo e Raul Danda.

João Gomes Cravinho explicou que, «em relação ao mais» Lisboa acompanha o que se passa «pelas vias normais», isto é, pela comunicação social e pelos relatos feitos pela embaixada portuguesa. Exempos claros de que, afinal, se está nas tintas para os que estão fora do círculo do poder.

E quando Cravinho diz que Lisboa acompanha o que se passa pelos relatos feitos pela embaixada portuguesa, está a esquecer-se que a embaixada lusa se limita, hoje como ontem, a ampliar a versão oficial do regime angolano.

Como se já não bastasse a bajulação de Lisboa ao regime do MPLA (no poder desde 1975), ainda temos de assistir à constante passagem de atestados de menoridade e estupidez aos portugueses por parte do secretário de Estado João Gomes Cravinho.

"Portugal não tem nada a ver com a questão de Cabinda. é um assunto de soberania angolana", afirmou João Gomes Cravinho à Lusa. Será mesmo a ignorância que leva este membro do Governo português a tapar a escuridão com uma peneira?

A política “made in Portugal” é pródiga nos políticos que, em bicos de pés, procuram estar na ribalta como se de verdadeiros stradivarius se tratassem. No entanto, quando vistos com atenção descobre-se que não passam de instrumentos de lata comprados por tuta-e-meia no Roque Santeiro.

Tenho dúvidas que João Gomes Cravinho saiba ler mais do que aquilo que manda a cartilha oficial do regime, tento fazendo neste caso ser a do PS ou a do MPLA. Mesmo assim, sempre poderia fazar um esforço para contar até 12 sem ter de tirar os sapatos...

26.09.2010 - orlando.s.castro@gmail.com
.

MPLA, no poder desde 1975, marca congresso extraordinário para 2011

.

NOTÍCIAS LUSÓFONAS

O MPLA, partido no poder em Angola desde 1975, vai realizar o seu 4º Congresso extraordinário em 2011 para avaliar o grau de cumprimento das promessas feitas nas eleições legislativas de 2008, anunciou o seu vice-presidente Roberto de Almeida.

Embora ainda sem data marcada, o congresso extraordinário do MPLA, que realizou o seu 6º conclave ordinário em 2009, tem como objectivo, segundo adiantou Roberto de Almeida durante uma deslocação à Lunda Norte, adoptar “novos métodos de actuação e funcionamento” das estruturas do partido.

Este congresso extraordinário vai decorrer sensivelmente a cerca de um ano das eleições gerais de 2012 onde serão eleitos os deputados à Assembleia Nacional e, de acordo com a nova Constituição aprovada em 2009, o Presidente da República, enquanto cabeça de lista do partido mais votado para o Parlamento.

A partir desta reunião máxima do MPLA deverá ainda ficar esclarecido se José Eduardo dos Santos, como tudo aponta que assim será, vai ser o candidato à sua própria sucessão e ser, pela primeira vez, eleito.

José Eduardo dos Santos ocupa a Presidência angolana desde 1979 e ganhou a primeira volta das eleições gerais de 1992. Na altura, a segunda volta, que deveria ser disputada com Jonas Savimbi, então líder da UNITA, foi interrompida pelo reatar da guerra que só terminaria em 2002 com a morte em combate do fundador do partido do “Galo Negro”.
.

FMI aprova crédito 353 milhões de dólares ao abrigo do acordo de “stand by”

.

NOTÍCIAS LUSÓFONAS

O Fundo Monetário Internacional anunciou hoje a aprovação de um crédito de 353 milhões de dólares (262 milhões de euros) a Angola, ao abrigo do acordo de “stand by” (SBA) entre Luanda e a instituição financeira.

Com o novo crédito, eleva-se para 882,9 milhões de dólares (cerca de 665 milhões de euros) o apoio total concedido pelo FMI, adianta comunicado da instituição.

A aprovação foi dada a 24 de Setembro pelo conselho executivo do FMI, em que foram avaliadas as segunda e terceira revisões do desempenho angolano ao abrigo do programa económico.

Aprovado em Novembro de 2009, o acordo SBA prevê o desembolso de 1,32 mil milhões de dólares ao longo de 27 meses.

O programa tem como objectivo ajudar o país a lidar com os efeitos da crise económica e financeira internacional, que em 2009 levaram a quebras do crescimento económico e das reservas externas angolanas.

O novo crédito é concedido apesar de não terem sido alcançadas duas metas quantitativas previstas no acordo, relativas à acumulação de pagamentos em atraso, internos e externos, frisa o comunicado.

Para Murilo Portugal, director adjunto do FMI, Angola precisa de implementar “vigorosamente” o programa de redução de dívidas em atraso.

A situação macroeconómica, adianta, “continua a melhorar” e as reformas “começam a dar frutos”, embora a agenda de reformas futuras seja ainda “substancial”, incluindo o reforço da capacidade de gestão macroeconómica e limitação das vulnerabilidades do país à flutuação dos preços petrolíferos.

Luanda “está a fazer progressos na implementação do programa de estabilização e reforma”, afirma o responsável do FMI.

Angola pretende reduzir o défice primário não petrolífero sem afectar as despesas sociais e investimentos prioritários, uma medida que o FMI considera “bem vinda”.

O Fundo apoia ainda as recentes reformas técnicas do sistema de leilão de moeda estrangeira e o plano para criar um fundo soberano, “dada a necessidade de suavizar a aplicação das receitas petrolíferas” no futuro.

“O proposto fundo vai necessitar de um enquadramento institucional sólido com contabilidade transparente, ligações bem especificadas à política fiscal e uma estratégia de gestão de activos conservadora”, refere o comunicado.

“As autoridades são encorajadas a completar as suas planeadas medidas de reforma, incluindo a publicação regular de relatórios de execução orçamental e do desempenho financeiro de empresas públicas”, adianta Murilo Portugal.

Outra reforma considerada prioritária pelo FMI é o “fortalecimento da governação e práticas institucionais do Banco Nacional de Angola”.
.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

JORNAL INGLÊS DIZ QUE DILMA É “UMA LIDER EXTRAORDINÁRIA”

.
Foto: Roberto Stucker Filho

HUGH O’SHAUGHNESSY – THE INDEPENDENT – CARTA MAIOR

O jornal The Independent destacou neste domingo que o Brasil se prepara para eleger no próximo final de semana a "mulher mais poderosa do mundo" e "uma líder extraordinária". As pesquisas mostram que ela construiu uma posição inexpugnável – de mais de 50%, comparado com menos de 30% - sobre o seu rival mais próximo, homem enfadonho de centro, chamado José Serra. Jornal também afirma que candidata tem sofrido ataques em uma campanha impiedosa de degradação patrocinada pela mídia brasileira.

A mulher mais poderosa do mundo começará a andar com as próprias pernas no próximo fim de semana. Forte e vigorosa aos 63 anos, essa ex-líder da resistência a uma ditadura militar (que a torturou) se prepara para conquistar o seu lugar como Presidente do Brasil.

Como chefe de estado, a Presidente Dilma Rousseff seria mais poderosa que a Chanceler da Alemanha, Angela Merkel e que a Secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton: seu país enorme de 200 milhões de pessoas está comemorando seu novo tesouro petrolífero. A taxa de crescimento do Brasil, rivalizando com a China, é algo que a Europa e Washington podem apenas invejar.

Sua ampla vitória prevista para a próxima eleição presidencial será comemorada com encantamento por milhões. Marca a demolição final do “estado de segurança nacional”, um arranjo que os governos conservadores, nos EUA e na Europa já tomaram como seu melhor artifício para limitar a democracia e a reforma. Ele sustenta um status quo corrompido que mantém a imensa maioria na pobreza na América Latina, enquanto favorece seus amigos ricos.

A senhora Rousseff, filha de um imigrante búlgaro no Brasil e de sua esposa, professora primária, foi beneficiada por ser, de fato, a primeira ministra do imensamente popular Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ex-líder sindical. Mas com uma história de determinação e sucesso (que inclui ter se curado de um câncer linfático), essa companheira, mãe e avó será mulher por si mesma. As pesquisas mostram que ela construiu uma posição inexpugnável – de mais de 50%, comparado com menos de 30% - sobre o seu rival mais próximo, homem enfadonho de centro, chamado José Serra. Há pouca dúvida de que ela estará instalada no Palácio Presidencial Alvorada de Brasília, em janeiro.

Assim como o Presidente Jose Mujica do Uruguai, vizinho do Brasil, a senhora Rousseff não se constrange com um passado numa guerrilha urbana, que incluiu o combate a generais e um tempo na cadeia como prisioneira política.

Quando menina, na provinciana cidade de Belo Horizonte, ela diz que sonhava respectivamente em se tornar bailarina, bombeira e uma artista de trapézio. As freiras de sua escola levavam suas turmas para as áreas pobres para mostrá-las a grande desigualdade entre a minoria de classe média e a vasta maioria de pobres. Ela lembra que quando um menino pobre de olhos tristes chegou à porta da casa de sua família ela rasgou uma nota de dinheiro pela metade e dividiu com ele, sem saber que metade de uma nota não tinha valor.

Seu pai, Pedro, morreu quando ela tinha 14 anos, mas a essas alturas ele já tinha apresentado a Dilma os romances de Zola e Dostoiévski. Depois disso, ela e seus irmãos tiveram de batalhar duro com sua mãe para alcançar seus objetivos. Aos 16 anos ela estava na POLOP (Política Operária), um grupo organizado por fora do tradicional Partido Comunista Brasileiro que buscava trazer o socialismo para quem pouco sabia a seu respeito.

Os generais tomaram o poder em 1964 e instauraram um reino de terror para defender o que chamavam “segurança nacional”. Ela se juntou aos grupos radicais secretos que não viam nada de errado em pegar em armas para combater um regime militar ilegítimo. Além de agradarem aos ricos e esmagar sindicatos e classes baixas, os generais censuraram a imprensa, proibindo editores de deixarem espaços vazios nos jornais para mostrar onde as notícias tinham sido suprimidas.

A senhora Rousseff terminou na clandestina VAR-Palmares (Vanguarda Armada Revolucionária Palmares). Nos anos 60 e 70, os membros dessas organizações sequestravam diplomatas estrangeiros para resgatar prisioneiros: um embaixador dos EUA foi trocado por uma dúzia de prisioneiros políticos; um embaixador alemão foi trocado por 40 militantes; um representante suíço, trocado por 70. Eles também balearam torturadores especialistas estrangeiros enviados para treinar os esquadrões da morte dos generais. Embora diga que nunca usou armas, ela chegou a ser capturada e torturada pela polícia secreta na equivalente brasileira de Abu Ghraib, o presídio Tiradentes, em São Paulo. Ela recebeu uma sentença de 25 meses por “subversão” e foi libertada depois de três anos. Hoje ela confessa abertamente ter “querido mudar o mundo”.

Em 1973 ela se mudou para o próspero estado do sul, o Rio Grande do Sul, onde seu segundo marido, um advogado, estava terminando de cumprir sua pena como prisioneiro político (seu primeiro casamento com um jovem militante de esquerda, Claudio Galeno, não sobreviveu às tensões de duas pessoas na correria, em cidades diferentes). Ela voltou à universidade, começou a trabalhar para o governo do estado em 1975, e teve uma filha, Paula.

Em 1986 ela foi nomeada secretária de finanças da cidade de Porto Alegre, a capital do estado, onde seus talentos políticos começaram a florescer. Os anos 1990 foram anos de bons ventos para ela. Em 1993 ela foi nomeada secretária de minas e energia do estado, e impulsionou amplamente o aumento da produção de energia, assegurando que o estado enfrentasse o racionamento de energia de que o resto do país padeceu.

Ela fez mil quilômetros de novas linhas de energia elétrica, novas barragens e estações de energia térmica construídas, enquanto persuadia os cidadãos a desligarem as luzes sempre que pudessem. Sua estrela política começou a brilhar muito. Mas em 1994, depois de 24 anos juntos, ela se separou do Senhor Araújo, aparentemente de maneira amigável. Ao mesmo tempo ela se voltou à vida acadêmica e política, mas sua tentativa de concluir o doutorado em ciências sociais fracassou em 1998.

Em 2000 ela adquiriu seu espaço com Lula e seu Partido dos Trabalhadores, que se volta sucessivamente para a combinação de crescimento econômico com o ataque à pobreza. Os dois se deram bem imediatamente e ela se tornou sua primeira ministra de energia em 2003. Dois anos depois ele a tornou chefe da casa civil e desde então passou a apostar nela para a sua sucessão. Ela estava ao lado de Lula quando o Brasil encontrou uma vasta camada de petróleo, ajudando o líder que muitos da mídia européia e estadunidense denunciaram uma década atrás como um militante da extrema esquerda a retirar 24 milhões de brasileiros da pobreza. Lula estava com ela em abril do ano passado quando foi diagnosticada com um câncer linfático, uma condição declarada sob controle há um ano. Denúncias recentes de irregularidades financeiras entre membros de sua equipe quando estava no governo não parecem ter abalado a popularidade da candidata.

A Senhora Rousseff provavelmente convidará o Presidente Mujica do Uruguai para sua posse no Ano Novo. O Presidente Evo Morales, da Bolívia, o Presidente Hugo Chávez, da Venezuela e o Presidente Lugo, do Paraguai – outros líderes bem sucedidos da América do Sul que, como ela, têm sofrido ataques de campanhas impiedosas de degradação na mídia ocidental – certamente também estarão lá. Será uma celebração da decência política – e do feminismo.

Tradução: Katarina Peixoto
.